Grande Sertão: Veredas – O diabo e o redemoinho!

(Por adreanekacs)

O texto a seguir contém spoilers sobre a trama!

A terra dos buritizais onde o diabo está no meio da rua, no redemoinho, é o palco do microcosmo de Riobaldo, narrador e protagonista de Grande Sertão: Veredas.

Antes de tudo é preciso dizer que esse livro não é fácil. São mais de 600 páginas de narração ininterrupta, sem quebras ou divisões de capítulos. A linguagem é a de um sertanejo, sendo caracterizada por um forte regionalismo e neologismos. As palavras são escritas da forma como são pronunciadas e isso confere mais vida ao livro. É como se o próprio leitor fosse o compadre Quelemém (interlocutor de Riobaldo, que não se pronuncia em todo o romance), escutando de perto o velho homem que um dia fora um jagunço lutando no sertão.

É indescritível o sentimento de acompanhar a fala do velho (agora fazendeiro) e suas questões filosóficas. Riobaldo se pergunta sobre o bem, o mal, deus, o diabo e a vida, partindo a seguir para relatos mais definidos de sua vivência. Quando criança, ele se aventurou em uma travessia do rio São Francisco com o garoto Reinaldo, logo ficando fascinado por ele. Reinaldo era Diadorim, a pessoa ao lado de quem Riobaldo viveria e lutaria em sua vida adulta.

Depois de perder sua mãe, o narrador é levado à fazenda de seu padrinho (na verdade, seu pai) Selorico Mendes. Mais tarde, Riobaldo é convidado por Zé Bebelo para integrar seu bando e lutar contra os jagunços Hermógenes e Ricardão. Depois, Riobaldo deixa o bando e integra o de Joca Ramiro, onde reencontra Diadorim. A amizade dos dois evolui para amor platônico. Riobaldo sempre presta atenção em Diadorim, grava na memória suas belas feições, estuda profundamente seu comportamento e sofre quando ele sofre. Diadorim também nutre um imenso carinho por Riobaldo e sente ciúmes quando o vê com mulheres (sobretudo Otacília, com quem Riobaldo termina por se casar). A relação deles não é jamais trazida para o plano físico, permanecendo ideal e impossível.

Após um conflito com Zé Bebelo (que termina com ele exilado em Goiás), o bando de Joca Ramiro se dispersa. Já seguindo o chefe Titão Passos, Riobaldo e Diadorim são informados de que Joca havia sido morto à traição por Hermógenes e Ricardão, o que desperta a fúria e o desejo de vingança de Diadorim, para a perplexidade de seu grande amigo. Nas Veredas-Mortas, o protagonista faz um pacto com o Diabo em uma encruzilhada, à meia noite, para derrotar os assassinos e trazer paz a Diadorim. Mas o demônio nunca é efetivamente mostrado, só há o silêncio, e o silêncio nada mais é do que nós mesmos em demasia. O diabo estava lá? Ele existe e não existe? Ele aceitou o pacto? Até que ponto as crendices populares diziam respeito à realidade? Não há resposta para essas perguntas e, até sua velhice, Riobaldo não é capaz de entender o que aconteceu naquela noite, se de fato algo aconteceu. Diante de um ponto de vista racional, nada ocorrera, mas não havia garantia.

O confronto final contra o bando de Hermógenes se dá quando Riobaldo já é o chefe do bando, no Paredão. É nessa batalha que Diadorim enfim consegue sua vingança, matando Hermógenes, mas sendo mortalmente ferido. A morte de Diadorim é o evento que mais atormenta Riobaldo e o enche de culpa, levando-o inclusive a adoecer. Logo ele descobriria o segredo de seu grande amor, quando suas roupas são retiradas e o corpo de uma mulher é revelado. Diadorim era Maria Deodorina, filha de Joca Ramiro. Seu amor impossível estava ao seu alcance, livre de todos os segredos e obstáculos que o envolvia, mas era tarde demais. O que restava a Riobaldo era somente a dor.

 

Posteriormente Riobaldo herdaria as terras de seu pai e se casaria com Otacília, mas sem jamais esquecer seu grande amor ou deixar de ser atormentado por suas dúvidas e lembranças. Ele esmiúça e explica tudo em demasia talvez por sentir a necessidade de entender, mas não há conclusão definitiva. Por mais que esse romance seja estudado, destrinchado e reavaliado em todo o mundo, sempre se chega a conclusões diferentes. Grande Sertão: Veredas é um livro único para cada leitor.

“O diabo não há! É o que eu digo, se for… Existe é homem humano. Travessia.”

Isso também pode lhe interessar

2 Comentários

Deixe um comentário

O seu endereço de e-mail não será publicado. Campos obrigatórios são marcados com *

Botão Voltar ao topo

Adblock detectado

Dê uma ajuda ao site simplesmente desabilitando seu Adblock para nosso endereço.