Análise | Death Stranding Director’s Cut

Disponível para PlayStation 4, PlayStation 5 e PC

Death Stranding Director’s Cut é a versão definitiva de uma das experiências mais interessantes que me recordo de já ter tido em um jogo eletrônico de grande porte. Sei que com indie games somos apresentados a esquisitices e coisas incomuns a todo momento, contudo quando o aspecto é um blockbuster do tamanho deste lançamento, suas peculiaridades enaltecem em muito sua proposta. E quando o orçamento não tem limites, barreiras podem ser ultrapassadas de uma maneira que o segmento independente apenas consegue sonhar.

Mérito disso parte da brilhante mente de Hideo Kojima, um dos maiores gênios da criação de jogos eletrônicos da antiga e da atual indústria de videogames. Responsável por uma das maiores franquias dos jogos, Metal Gear, produzido na época em que trabalhava para a Konami. Ao final do ano de 2015, após deixar a Konami, Kojima se une com a Sony para seu primeiro projeto independente, sob o comando de seu próprio estúdio, a Kojima Productions. Com isso, em junho de 2016, foi a primeira vez em que se ouviria falar de Death Stranding.

Seu lançamento original aconteceria alguns anos depois, mais precisamente em novembro de 2019, exclusivamente no PlayStation 4. Após isso, em julho de 2020, foi a vez do PC ganhar uma versão, em parceria com a publisher 505 Games em sua distribuição global. Mas uma nova era de consoles surgiu, e então chegamos a Death Stranding Director’s Cut, lançado no último dia 24 de setembro, exclusivamente no PlayStation 5, trazendo novos conteúdos, uma melhor e refinada experiência gráfica e de jogabilidade, a qual tratarei mais a frente desta análise.

Conteúdos estes que, até então, permanecem exclusivos do PS5. Não existe, neste momento, previsão para que a Director’s Cut seja lançada para a versão de PC. O mesmo ocorre no PlayStation 4, que segue com o game apenas em sua versão original, sem opção de atualização para a plataforma. Contudo, aqueles que detém o jogo em sua versão de PS4 e já possuem o PS5 e quiserem migrar para a versão do novo console, podem sim efetuar essa atualização, mediante o pagamento de uma taxa digital de 10 dólares. Nada de atualização gratuita, que fique bem claro isso.

Sei o que o leitor está pensando: “e vale 10 dólares a mais para ter essa versão?”. Veja só, se você já está no PlayStation 5, e está jogando a versão de PS4, particularmente eu recomendaria fazer essa atualização e ter todo o poderio do PS5 sendo explorado na obra, desde o controle Dualsense sendo usado em seu pleno potencial, aos gráficos aprimorados, constante taxa de quadros em 60 frames, alta resolução, HDR e toda essa parafernália visual. Em termos de conteúdos inéditos, estes estão fragmentados ao longo da campanha original, aqui e ali, dando um melhor ritmo e dinâmica a tal progressão. Se você já completou a campanha e não tem o menor interesse em voltar a explorar esse conteúdo, talvez jogar tudo de novo… é bem capaz que os novos itens e ferramentas não te impressionem muito.

Em relação a minha experiência pessoal com a obra, estou tendo acesso a Death Stranding pela primeira vez aqui, no PS5. Ao longo desta análise não poderei comparar muito esta nova edição lá com sua versão original de PS4. Minha visão aqui é de quem está chegando agora, pegando a melhor versão possível de um título que teve, sim, críticas lá em 2019, mas que passou por diversas atualizações e um importante refinamento inteligente para esta Director’s Cut. Quem ainda não jogou, não terá melhor momento do que agora!

Jogo do Carteiro

Death Stranding quando lançado lá em 2019 foi apelidado por muitos na internet como o “Jogo do Carteiro“, internacionalmente se utilizou muito o termo “walking simulation“, fazendo uma alusão ao fato do jogador passar grande parte da experiência de jogabilidade andando entre pontos ligeiramente distantes. Entretanto atribuir apenas essa característica ao jogo, hoje em dia, me soa extremamente injusto. O título é muito mais do que isso, é uma experiência de imersão em um vasto mundo repleto de mistérios que vai sendo revelado de pouco em pouco.

A obra se distancia muito dos jogos de ação a qual Kojima sempre criou na série Metal Gear, mas o traço de excentricidade não foi perdido, trazendo aquela visão singular que o autor tem em suas produções. É difícil até mesmo enquadrar Death Stranding como um jogo de ação. Particularmente me parece muito mais um jogo de aventura de mundo aberto, cujo seu foco principal é cumprir missões de exploração, sob determinadas condições, enquanto vai descobrindo mais sobre o que ocorreu com o mundo ao seu redor e como as pessoas chegaram ao atual status quo.

Alias revelar demais o que está acontecendo no mundo de Death’s Stranding não me parece nem um pouco indicado, já que parte da boa experiência do título é acompanhar essa história e ir descobrindo por conta própria o que é o próprio tal evento que destruiu o mundo e quais as suas muitas regras de sobrevivência nesse ambiente altamente hostil.

Contudo o básico posso contar. O jogo se passa dentro dos Estados Unidos da América em um cenário pós apocalíptico, a qual um cataclismo mudou todas as regras da sociedade mediante um evento que justamente dá nome ao título. Vivos e mortos estão misturados em um ambiente a qual estes fantasmas pairam pelo mundo externo, invisíveis a olhos nus, mas são extremamente mortais, causando não só a morte de pessoas, mas explodindo regiões em imensas crateras de destruição quando incomodados.

As pessoas então se encontram isoladas em cidades menores, distantes uma das outras, com uma tecnologia limitada que impede a invasão destes seres, ainda que também existam riscos dentro destes locais quando as pessoas morrem por ali. Corpos precisam ser levados para longe e cremados, por via das dúvidas. E ainda assim, suas cinzas causam problemas ao mundo dos vivos. Não se pode nem mais morrer em paz neste contexto.

Para piorar a situação, esse mundo sofre de um anormal fenômeno de chuva temporal. Essa chuva envelhece tudo que toca, sejam pessoas, sejam objetos. Isso causa um tremendo problema para viajar por esse Estados Unidos desolado por fantasmas e chuvas que causam dano irreversível ao tempo, a qual ambas as ameaças estão entrelaçadas e se apresentam simultaneamente dentro do escopo da jogabilidade.

Para um mundo de isolamento, a qual as pessoas estão confinadas, restam poucos corajosos, com habilidades paranormais aparentemente, que podem sobreviver nesse ambiente hostil. E estas pessoas tem um papel importante nessa caótica sociedade: levar o que for preciso, a quem precisar. Os entregadores, daí a brincadeira com nossos profissionais dos Correios.

Death Stranding inclusive teve um destaque interessante em 2020, durante o início da pandemia da Covid-19, a qual muitas pessoas traçaram paralelos do jogo, com o confinamento e isolamento a qual todos passados, em diferentes medidas, assim como o papel importantíssimo que os entregadores tiveram para continuarem trabalhando e não deixar as engrenagens da sociedade estagnarem. Varejo online de produtos cresceu, entrega de comidas e remédios foram essenciais… a pandemia acabou demonstrando como estes profissionais desempenham uma função primordial a sociedade, aceitando inclusive os riscos de serem contaminados em pró de suas obrigações laborais. E Death Stranding preconizou essa percepção que só fomos perceber ano passado, quando a pandemia trouxe muitas incertezas e dúvidas sobre o risco de sair de nossas próprias casas.

Do ponto A ao ponto B

Em termos de jogabilidade, a proposta de Death Stranding é direta e simples, porém o mesmo não pode ser dito sobre sua execução. Seu objetivo é levar mercadorias e leve do ponto A ao ponto B, uma das mais básicas tarefas de jogos de videogame com liberdade para explorar um mundo aberto. Todo jogo tem isso, porém normalmente como uma atividade secundária, algo que inclusive muita gente odeia fazer.

E Kojima pega uma das coisas mais chatas de se fazer nos videogames e transforma em algo totalmente interessante, imersivo e até mesmo tenso em diversos momentos. Isso ocorre por meio de um emaranhado de situações e regras dentro de um complexo sistema com diversas liberdades e possibilidades. Vamos por partes então.

Primeiro que a viagem até o destino da entrega não é predeterminada pelo jogo, mas pelo próprio jogador, que deve avaliar um enorme mapa geográfico, prestando atenção em pontos e rotas que ele deve determinar ser fácil ou difícil seu percurso. Viajar em linha reta nem sempre é o melhor caminho, especialmente quando uma enorme colina ou penhasco pode estar nesse percurso. Aqui você faz sua trilha, e quanto melhor conhecer a região, ao explorá-la, melhores suas rotas serão.

Gosto muito da mecânica de abrir o mapa, definir quantos pontos de checagem bem entender pelo mapa, até que o último ponto seja seu destino. Isso se traduz na jogabilidade com uma trilha holográfica pelo mapa, a qual você pode alterar ou até mesmo ignorar. Totalmente prático e funcional. E o mapa tem um efeito tridimensional, ou seja, o jogador pode mudar seu ângulo para entender onde encontrará grandes aclives e declives, e decidir se deverá ou não encarar estas rotas, podendo sempre, é claro, dar a volta e procurar caminhos menos penosos.

Aí vem a segunda etapa dessa ideia de sair viajando por grandes distâncias: estar preparado para tudo. E para isso, tem a segunda etapa de planejamento: o de decidir o que deve levar para a viagem. Diferente de outros jogos em que seu personagem tem bolsos infinitos ou que não causam qualquer volume físico ao seu personagem, em Death Stranding tudo ocupa um espaço físico. Um par de botas extras? Seu personagem vai pendurar na cintura. Uma escada portátil? Ele vai colocar em seus ombros. Não tem um item que não vire uma parafernália visual e que vá causar impacto no peso e caminhar do jogador.

Então temos uma deliciosa física que envolve carregar somente aquilo em que seu medidor de peso aguenta, o que é bastante porque você tem um exoesqueleto mecânico, assim como empilhar tudo ao longo do seu corpo, e especialmente na sua prática e expansiva mochila. Chega a ser cômico seu personagem com uma pilha de caixas maior do que sua própria altura? Com certeza, mas é no absurdo que moram as melhores qualidade de Death Stranding.

Ficar pesado significa se cansar mais. Exigindo parar, descansar, tomar água. Elementos que talvez você encontraria tranquilamente em um jogo de RPG e não acharia nem um pouco ruim. Não só isso, mas se equilibrar, afim que sua pesada carga não lhe derrube mediante inclinações por conta do peso é um dos melhores aspectos físico do jogo. Você não pode sair correndo por aí como um louco, achando que está dentro de um videogame, ainda que claramente esteja. É preciso ter cautela, segurar gatilhos para balancear o equilíbrio de sua carga, o que lhe fará andar ainda mais devagar, enquanto presta atenção na estrada a sua frente, repleta de pedras, rios, subidas e descidas.

Sabe aquela sensação que você tem ao descer correndo um morro e vendo a gravidade lhe puxar velozmente para baixo? Há isso em Death Stranding. O personagem vai começar a acelerar além do seu controle, vai começar a cambalear e se você não conseguir freá-lo, ela vai se espatifar no chão lindamente. E daí, você me pergunta? Bem, cair significa derrubar sua carga, que irá sofrer dano, que se traduz em menos pontos de experiência ao final da entrega ou até mesmo a perda completa do pacote, o que irá lhe obrigar a fazer tudo novamente.

Nesse ponto você já entendeu que o jogo é muito sobre auto gerenciamento. Qual caminho seguir, como se planejar, o que levar, e tomar muito cuidado para não fazer bobeira e derrubar e estragar sua preciosa carga. Tenha em mãos escadas, cordas e até mesmo botas extras, pois estas também se danificam com o uso. Chegar a beira de um penhasco e não ter uma corda pode ser fatal… pois vai lhe obrigar a tomar outra rota, gastando tempo e te levando a outros perigos a quais ainda nem mencionei.

Rios também são um problema aqui. Pois atravessá-los a pé pode ser bem arriscado. A correnteza tem sua própria física, e empurra o jogador, dá para sentir a força das águas, o que é bem impressionante. Se for fundo demais, as águas vão lhe arrastar e você irá perder suas entregas, que serão levadas rio abaixo.

Ladrões e fantasmas

Então há os perigos, mais precisamente três. O primeiro são acampamentos de ladrões, que vivem fora das cidades, sempre trajando trajes que cobrem completamente seus rostos (parecem trajes radioativos que vemos em filmes e séries). Estas áreas tem uma espécie de sensor, a qual é ativado assim que o jogador mete o pé dentro da área demarcada. Aí já era, estes ladrões, chamados no game de Mulas, virão atrás de ti para lhe espancar e roubar tudo que você possuir.

Assim, lutar contra estes inimigos não é tão complicado assim, exceto se um número expressivo lhe cercar. Houve um momento em meu gameplay em que vários chegaram juntos, dentro de uma caminhonete. Impossível que eu desse conta de todos de uma vez. O que fiz? Subi em uma ladeira íngreme próxima e me enfiei em um caminho de pedras. Isso dificultou as coisas para o bando, que se dividiu, enfileirou e me permitiu meter a mão um a um. Vê como o jogo lhe dá liberdade para agir e pensar de uma forma bem flexível?

Entendo também que esta Director’s Cut também muda um parâmetro bem simples do combate, que é dar ao jogador uma arma de choque bem mais cedo do que na versão do jogo lá de 2019. Essa arma não é a coisa mais incrível do mundo, mas surge relativamente cedo na campanha e é sempre útil para derrubar um ou dois bandidos quando estes estão tentando lhe cercar. Então sempre tenha uma destas armas em mãos, com a munição plenamente carregada, por sim, elas esgotam e quebram alias. Mas no geral, é tranquilo dar cabo de um ou dois inimigos no muque mesmo.

Opa, mas esse é só um dos riscos da viagem. Há mais dois. O segundo é a chuva temporal. Lembra que eu disse que ela causa envelhecimento em tudo que toca? Então, isso quer dizer que a sua mercadoria vai envelhecer e estragar por completo se você se mantiver por tempo demais em áreas em que está chovendo. E sinceramente não consegui entender se nestes casos você procura um abrigo e espera ela passar (pois nunca percebi ou fiquei parado tempo demais pra saber se ela passa). Até porque a chuva temporal também significa o terceiro perigo: os fantasmas BTs.

Aqui uma observação: BT é uma sigla em inglês para Beached Things, que na localização do jogo para o português foi renomeado de EP, que seria Entidades Praianas. Não tenho preferência pelas siglas, mas BT me parece mais fácil associar ao que estou falando, já que em nosso idioma normalmente usamos EP para nos referir a palavra “episódio“. Bobagem minha apenas. E o que é a tal praia? Isso deixo para que você descubra quando for jogar, pois faz parte da viagem de descoberta da trama. Mas é um conceito muito surreal, e ainda assim incrível.

Enfim, voltando, BTs são uma ameaça real quando se está andando pelo mundo de Death Stranding realizando entregas. Se há chuva, em algum lugar próximo deve haver alguma forte manifestação de BTs. E aqui surgem dois problemas: em uma zona de fantasmas, você precisa se agachar, andar lentamente, as vezes até prender a respiração (e pode desmaiar se prender demais) enquanto anda em meio a diversos fantasmas e o que tem demais em fazer isso? Bem, está chovendo, não? O que significa que tudo que você está levando está se deteriorando aos poucos. Ser devagar demais também pode levar a perder seus pacotes.

E sair correndo no meio dos BTs? Uma lógica bem videogame, não? Talvez isso funcione em alguns momentos, mas se você estiver como um burro de carga, levando muitos pacotes, no limite de seu peso, não vai conseguir correr o suficiente, provavelmente vai tropeçar, escorregar e aí meu amigo… já era. Não vou contar aqui, mas a primeira vez que um BT lhe pega, com certeza é um momento em que ficará marcado em sua memória. É fantástico a tensão desse evento e ele corresponde totalmente ao medo de ser pego. Você não quer isso acontecendo contigo a todo o momento.

Alias, quando um BT lhe detecta, ele passa a voar em sua direção e do solo sai pequenas erupções de uma gosma preta. Dá para o jogador, agachado, desviar delas, prendendo a respiração em pequenos intervalos e tentar sair do radar do BT. É tenso, exige muita cautela e um pouco de sorte, mas é viável fazer isso. E um outro detalhe… estas entidades fantasmagóricas possuem esse nome porque são realmente invisíveis a olho nu! Você nunca vai ter 100% de visão de tudo ao seu redor, onde estão e para onde vão.

Eis que então tenho que falar do bebê que está na cápsula de toda arte promocional do jogo, o BB. A sigla não é de bebê, mas de “Bridge Baby“. Bridge é a grande corporação de entregas, entre outras coisas, que está tentando reconectar todo os Estados Unidos. É a empresa que desenvolveu estes bebês, que não são bem bebês. O jogo os tratam como equipamentos desde o início, ainda que o protagonista meio que humanize bastante o BB que ele possui, e que tem mesmo uma trama que você vai descobrindo aos poucos. Enfim, para que diabos servem os BBs? Para enxergar os BTs.

Sem um destes, o jogador não pode visualizar os BTs. Os BBs são meio que um acessório do jogo, por assim dizer. Eles são acoplados a sua roupa, conectados a uma antena que lhe alerta quando adentra em uma área de BTs, inclusive piscando, alertando sonoramente, quando mais perto estiver de um, e em qual direção ele está. Mas isso, claro, tem um revés, pois em Death Stranding não há causa sem efeito. O BB começa a chorar perto dos BTs, e isso pode atraí-los também. Aí o jogador precisa acalmar o BB embalando sua cápsula por alguns segundos. O BB tem uma barra de saúde e ele pode se desativar se essa barra se esvaziar por completo. No jogo isso causa uma doença a ele. O jogador pode restaurar sua saúde e barra nos postos de entrega, a qual fica um quarto de descanso para você.

Enfim, então Death Stranding tem confrontos? Sim, e por mais que a proposta seja evitá-los ao máximo, evidentemente haverá missões onde estes confrontos serão inevitáveis. O mapa inclusive tem um layout inteligente que coloca perigos tanto em rotas mais fáceis, quando nas mais complicadas. É bem difícil encontrar um caminho em que não vá topar com empecilhos. E nestas horas de conflito, é bom que você esteja pronto, com armas, granadas e observando o terreno ao redor para trabalhar com eles a seu favor. Ah e BTs não são imbatíveis, mas há um custo bem alto para lutar contra eles. Você fará isso somente em casos de extrema necessidade.

Jogadores reais espalhados pelo mundo

Outro elemento que coloca mais crédito a excelência de Death Stranding é a forma como o mundo do jogo sofre interação Online com sua própria comunidade, em uma experiência single player compartilhada. Uma ideia que molda a jogabilidade e como a experiência é moldada de forma única e singular dentro da sua própria comunidade. Calma que irei explicar em maiores detalhes.

Antes de mais nada é preciso entender que o mapa do jogo é basicamente todo os Estados Unidos da América. Seu objetivo principal, enquanto entrega pacotes, é ir de área em área desse imenso mapa, conectando as fábricas, cidades e instalações de pesquisas. Você carrega consigo uma chave eletrônica que permite que isso aconteça. Isso divide a exploração em dois momentos: quando você está em uma área que ainda não está na rede online desse mundo, promovido pela empresa do plot principal, a Bridges, e em um segundo momento quando já conectou a área e agora se beneficia desse status online.

Quando se está explorando estas regiões ainda offline, o jogador tem acesso ao mundo como os desenvolvedores idealizaram, trilhas normais, paisagem intocável, ameaças que ainda não descobrir etc. Mas para progredir na trama, pede-se que faça essa conexão entre as regiões e áreas, e muitas missões principais de história exigem que o jogador volte para rotas e trilhas já traçadas, em ambientes já visitados, para aprender coisas necessárias a seguir em frente. É nesse momento, quando tudo está online, que tudo mundo.

Áreas online significam que você pode ver todas as interações que os jogadores tem feito no ambiente ao redor. Sabe aquele riacho chato de passar por conta da correnteza forte? Talvez agora lá tenha uma ponte, ou uma simples escada, porque algum jogador colocou ou construiu isso lá e simplesmente deixou para que outros pudessem usufruir. Olha que sensacional!

Claro que o mundo não vai ser extremamente poluído com um milhão de itens largados a todo o canto. Ainda não estou certo como essa tecnologia de interação funciona, mas tudo indica que você tem acesso somente a uma parte do que os jogadores estão largando no mundo, talvez as mais eficientes. Até porque há um sistema de curtidas para estas camaradagens deixadas pelo ambiente aberto. Curtinhas recebidas geram pontos de experiência ao jogador que deixou sua obra lá, e isso o faz subir de levar, o que lhe rende melhores atributos, como poder carregar mais coisas, melhorar seu equilíbrio entre outras coisas. Você não sobe de nível apenas com curtidas, entregar encomendas é a forma mais eficiente ainda, contudo as curtidas claramente turbinam essa escalada.

E não só construções, escadas e cordas surgem nas áreas online, mas um milhão de outras placas de avisos podem estar por toda a parte do mundo, em uma estilo bem Dark Souls. Algumas placas inclusive podem inclusive causa efeitos naqueles que passarem por eles, como revitalizar a barra de cansaço, a saúde do BB ou até mesmo criar um impulso de velocidade em seu veículo, caso esteja em um.

Inclusive existem projetos dentro do mundo do jogo que são completamente colaborativos, como enormes auto estradas. É preciso de um número de jogadores interajam em conjunto nestes pontos, doando materiais para expandirem cada vez mais a estrada em constante construção. É muito impressionante voltar para estas áreas e perceber que o mundo está crescendo agora que tudo está online.

Existe um sentimento de gratidão nesse aspecto do título, a ponto de também fazer com que você também queira colaborar e deixar sua marca nesse mundo. Usou uma escada para subir uma encosta? No início é normal o jogador usar e pegar o item de volta. Contudo quando o mundo online se abre, você simplesmente passa a deixar as coisas por aí, na esperança que ela passe a ser útil para alguém.

E não apenas melhorias e construções ficam espalhadas pelo mundo. Quando em uma área online, passa a ser muito comum encontrar pacotes perdidos pelo mundo, deixados por outros jogadores. Você pode coletar estes pacotes e entregar em seus respectivos pontos, ganhando experiência por tal mérito. E o jogador original será avisado que você fez uma entrega por ele. É muito legal isso.

Existe até mesmo um armário compartilhado com a comunidade nos pontos de entregas, a qual você pode deixar itens lá dentro e estes serão entregues a outros jogadores reais. E ao fazer isso, você também passa a receber coisas legais de outros jogadores. Assim como também existem caixas postais no meio do nada, em que você pode deixar pacotes para que outras pessoas entreguem para você, caso esteja levando coisa demais e esteja muito lento por conta disso.

Os meios de interação são vastos e surpreendem a todo momento. Você nunca verá um outro jogador dentro do mundo, porque não é essa a proposta. Contudo as intervenções e interações estão todas por ali. O mundo muda ao seu redor. Você percebe que não está sozinho nessa missão. É uma sensação muito boa. E de alguma forma, é um recurso que em nenhum momento parece quebrar a experiência ou gameplay. Nunca topei com construções sem sentido ou sacanas. Não sei qual o filtro de moderação código do jogo para isso, mas é bem eficiente.

Outro elemento de jogabilidade que não mencionei por aqui, mas vale a menção são os veículos. Porque é claro que em certo ponto da campanha, ficar andando, ainda mais revisitando trechos já conhecidos, podem ficar extremamente chato a pé. Para isso o jogador irá contar com diverso veículos, desde motos a caminhonetes. Todos com um bom compartilhamento de cargas, permitindo assim levar pacotes ainda mais pesados ou em grandes quantidades.

Claro que os veículos também possuem suas regras, como limite de peso e o impacto que isso causam em suas baterias, já que todos são elétricos. Quando se está em uma área online, pode ter certeza que irá encontrar grandes postes de recarga de bateria de veículos, deixado por outros jogadores, porque os mesmos acabaram chegando a esse ponto e viram que seus veículos estavam precisando de uma nova carga. Veja só como um elemento de gameplay se conecta a outro aqui. É fabuloso.

Inclusive, lá em meados da exploração da segunda área do jogo (o mapa dos Estados Unidos é divido em três), o jogador passa até mesmo a poder acessar veículos deixados em áreas comunitárias por outros jogadores. Muitos customizados, com suas próprias cores e personalidades. Quão maneiro é isso. Afinal você também pode construir seus veículos, mas há um custo para fabricação, e nem sempre você quer sair pelo mundo coletando recursos apenas para isso. Especialmente em momentos avançados, quando você precisa começar a largar seus veículos para ir para terrenos ou trechos a qual eles não conseguem ir.

O sentimento de compartilhamento comunitário é muito forte quando se passa a sentir os efeitos dessa interação online. É sem dúvida um dos pontos mais fortes da experiência de jogabilidade de Death Stranding, tornando-o muito único. Criando momentos realmente singulares para cada um que vá se aventurar pelo título.

Rostos famosos

Cheguei até este ponto da análise e não citei em nenhum momento o nome de Sam Bridges ou de Norman Reedus, sei disso. Mas foi porque quis contextualizar a experiência de gameplay refletida na visão como jogador, sem associação com os rostos famosíssimos que iremos encontrar por aqui. Lembra que mencionei que o orçamento de Death Stranding não deve ter limites? Pois é, porque o cachê de grandes estrelas de Hollywood não deve ser nada barato. E Kojima não teve medo de convidar gigantes do entretenimento para atuarem aqui.

Mas vamos lá, o protagonista do jogo é Sam Bridges, interpretado pelo ator Norman Reedus, o Darryl de The Walking Dead. E quando digo interpretado, quero dizer que o ator emprestou sua voz e também seu corpo, por das mais modernas técnicas de capturas, inclusive facial. Para um videogame o resultado é muito impressionante. Ainda mais quando penso que esse foi um título originário do PlayStation 4. É um jogo muito a frente de sua geração nesse sentido visual, não há qualquer dúvida disso.

As expressões faciais de Norman Reedus foram capturadas nos mínimos e impressionantes detalhes. Seja nas cutscenes, seja durante o gameplay, seja no ambiente do quarto em que o jogador descansa e que Reedus quebra a quarta parede em diverso momentos, olhando para a câmera, piscando e apontando para coisas no quarto, como se tivesse chamando a atenção do jogador. Detalhes, detalhes, é aqui que mora a maestria quando se quer algo excepcional.

E não só Reedus, pois Death Stranding tem um elenco de grandes talentos do cinema. Todos com capturas faciais, de movimento e na voz. É inacreditável o elenco que Kojima conseguiu reunir aqui. Mads Mikkelsen, Lea Seydoux, Margaret Qualley, Guillermo Del Toro, Nicolas Winding Refn, Tommie Earl Jenkins, Troy Baker e Lindsay Wagner.

Dou como destaque a participação de Guilhermo Del Toro, que no jogo interpreta o cientista conhecido como Deaman, afinal Del Toro é um cineasta, atua como roteirista, diretor e produtor de filmes. Vê-lo fazendo um personagem em um videogame é muito maneiro. Tão bacana quanto é ver Mads Mikkelsen, que ganhou muita visibilidade alguns anos atrás quando interpretou o serial killer canibal Hannibal Lecter na série Hannibal. Mikkelsen interpreta o misterioso personagem Cliff, que tem um arco narrativo direcionado justamente o BB que Sam (Reedus) carrega durante o jogo.

Outro ponto que me chamou um pouco a atenção, é que desta vez o Kojima parece ter acertado a mão ao apresentar fortes personagens femininas, sem a necessidade de sexualizá-las e passar por toda a polêmica que o mesmo enfrentou quando criou a Quiet em Metal Gear Solid V. Quer dizer, não vou criar caso pelo fato de uma das principais personagens, interpretada pela belíssima Lea Seydoux se chamar Fragile (Frágil). A meu ver a referência aqui é muito mais voltado aos serviços postais e ao cuidado com que pacotes precisam ter, do que uma referência boba dizendo que o sexo feminino é mais frágil. Fragile inclusive deixa bem claro em um de seus primeiros diálogos no jogo que de “frágil” ela não tem nada. E ao longo da aventura fica claro sua força, competência e independência.

Com um elenco tão grandioso assim você até fica na dúvida de jogar Death Stranding com o áudio em inglês, ouvindo as vozes originais destes grandes talentos, ou se aproveita da também excelente localização em português que o jogo recebeu, com direto a própria dublagem em nosso idioma. Ambas são sensacionais. A dublagem está muito bem feita, com todo o cuidado que temos com a sincronia labial e grandes vozes da nossa dublagem no elenco nacional.

Essa direção cinematográfica para Death Stranding dá uma sensação de muito impacto dentro da imersão e da estrutura narrativa proposta. Kojima segue sem medo algum de criar grandes cutscenes de diálogos, flashbacks e também diversos momentos de ação. Leve o tempo que for, deixando o jogador apenas assistindo, de forma maravilhada, o que quer que esteja acontecendo na tela. Principalmente no começo, quando muito é mostrado, mas nem tudo é explicado. Se fosse um filme, você seria facilmente fisgado e não conseguiria sair de frente da tela enquanto tudo não se resolvesse. Sendo um videogame, em torno de 40 a 60 horas de gameplay, as pausas acabam sendo obrigatórias. Mas nunca em meio a cutscenes. Você sempre irá passar por todas até voltar ao jogo em si, para aí descansar um pouco.

Considerações finais

Nossa, essa análise foi realmente longa, não? Isso sempre ocorre quando encontro jogos realmente singulares e que pensam fora de uma certa bolha de normalidade que ronda a indústria de desenvolvimento de jogos eletrônicos. Acaba que surgem muitos aspectos que valem a pena a prosa, explicações e reflexões. É muita coisa, para pouco tempo.

Death Stranding é uma experiência interessante, imersiva e muito impactante. É o melhor jogo do mundo? Longe disso, mas é uma daquelas obras visionárias. Que enxerga além das mecânicas básicas que envolvem muitos outros jogos. Pega um dos elementos mais tediosos do games, a missão de entregar coisas de um lado para o outro, e cria ricamente complexo, e portanto reinventa conceitos e ideias. É um jogo que dá para chamar de inovador.

Existe ainda toda uma preocupação em entregar uma obra cinematográfica, em comum acordo com ela também ser uma obra para um videogame. Kojima sabe conduzir e dirigir a trama aqui proposta. Não é para menos que seu estúdio deve enveredar para o ramo do cinema em seus próximos projetos. Parece ser um sonho do produtor, que já se provou mais do que competente para isso. A escalada do elenco composto por atores famosos dá um ar muito imponente a Death Straning. Não é a primeira vez que isso acontecer em um jogo eletrônico, mas é a primeira vez que isso não dá a sensação de uma mera “participação especial” ou “fanservice“. Não, aqui é uma obra séria, que entrega a arte do interpretar um personagem ficcional.

Claro que mesmo assim não é um jogo isento de crítica. Acredito que sua jogabilidade, bem cadenciada, pode não agradar a todo mundo. Ficar planejando rodas, gerenciar pacotes, ficar andando por muito tempo, apenas lidando com adversidades do percurso, pode não ser a praia para muitos jogadores, especialmente para aqueles que chegarem aqui esperando uma ação furtiva ou ativa de um Metal Gear Solid. A distância entre estes títulos é monumental.

Mesmo assim, ainda digo que o jogo tem um bom ritmo e dinâmica, especialmente se você souber lidar, e ignorar muito as missões secundárias que nada acrescentam ao plot principal a qual em um primeiro momento é exatamente o que vai lhe despertar a curiosidade aqui. E me parece que parte desse melhor ritmo de progressão vem a partir desta Director’s Cut, que introduz coisas mais cedo ao gameplay, e oferece boas otimizações dentro do ciclo de sua própria exploração e metas.

Nesta versão o jogador não demora tanto a ter uma arma, ainda que seja basicamente uma taser (choque), ou a sua primeira moto, otimizando muito a exploração do primeiro mapa do jogo, enquanto o robozinho de entregas, que automatiza algumas coisas, surge na segunda área, quando você já não está tão afim de voltar a áreas visitadas apenas para realizar tarefas sem importâncias, estando mais afim de avançar na trama, que começa a ficar ainda mais intensa. Até mesmo o combate aos BTs, não leva o tempo que pensei que levaria, e o arsenal é bem generoso de não me deixar sem algo para lidar com eles.

Quanto a missão inédita nesta versão, ela surge em meados do segundo capítulo da história, e envolve uma velha fábrica no primeiro mapa. E parece ser algo que é feito em etapas. Particularmente não achei nada excepcional. Inclusive só fui descobrir que ela fazia parte do conteúdo inédito quando fui pesquisar sobre a mesma pela internet. Ela está bem inserida dentro das tarefas dessa primeira parte da campanha. Acaba sendo muito natural visitar essa áreas, pois fica entre o caminho de missões principais. Mas as recompensas em cumpri-la faz toda a diferente. É dela que vem a primeira arma do jogo e um exoesqueleto aprimorado, permitindo levar mais coisas pesadas a pé. Foi uma boa adição, mas parece um ótimo conteúdo para quem está iniciando o jogo, não para quem está trazendo seu save lá do PS4.

Também não posso concluir essa análise sem mencionar o quão incrível Death Stranding Director’s Cut está rodando no PlayStation 5 e em seu controle, o Dualsense. A começar que o visual no PS5 é absurdamente lindo. O foto realismo da ambientação é muito impressionante. Folhagem, o efeito da correnteza no rio, sombra em pequenas pedras, a luz passando em meio a florestas, a gosma preta dos BTs, e até mesmo as já mencionadas expressões faciais dos personagens. É muito incrível. E o jogo roda lisinho, sem queda de frame, a 60 quadros por segundo, sem telas de carregamento entre gameplay e cutscene. Eu nem imagino como esse jogo deve rodar no PS4, mas aqui é sem sombra de dúvida a experiência definitiva dessa obra prima.

No que diz respeito ao Dualsense, devo admitir que não achei os gatilhos sensíveis a pressão tão incríveis assim. A vibração também não é tão pontual e detalhada quanto é em Ghost of Tsushima Director’s Cut. Como acabei de passar por ambos os títulos, a comparação é inevitável. A vibração do galope do cavalo em Tsushima, não vi nada parecido por aqui. Contudo gostei muito dos efeitos sonoros que saem do controle ao jogar Death Stranding. Desde a carga sensível fazendo barulho ao passar por terrenos instáveis quanto ao bebê chorando direto no controle (e você o embala usando o sensor de movimento). Os efeitos sonoros tem um grande impacto ao saírem do controle.

E isso é Death Stranding Director’s Cut no PlayStation 5. Ufa! Para quem está chegando agora a plataforma, e não teve a oportunidade de jogá-lo no PS4, este é o melhor momento. Não resta qualquer dúvida. Apesar de ter sido lançado no console passado, é um título que sequer teve tempo de pensar em envelhecer, se saindo muito bem como um jogo que tem cara de nova geração. Quem o debulhou em 2019, talvez não tenha tanto a vontade de fazê-lo aqui novamente, contudo o ritmo dessa experiência certamente está bem mais agradável aqui. Sua adição ao PS5 é mais do que certeira. É, sem qualquer dúvida, uma das mais geniais obras de Hideo Kojima.

Galeria

Este slideshow necessita de JavaScript.

Dando uma nota

Mundo criado para o jogo é uma coisa insana, com muita criatividade e originalidade - 10
Visualmente o jogo é um tapa na cara, com um resultado incrível no PlayStation 5 - 9.5
Entrega uma jogabilidade para contemplar o mundo ao redor, se dividindo entre tensão e calmaria - 8.5
Direção cinematográfica do jogo é fantástico, atores dão 100% em seus papéis - 10
Integração do mundo online é de se impressionar, trabalha muito em favor da experiência single player - 10
Há uma boa dose de micro gerenciamento, de rotas e cargas, e tem formas de automatizar isso - 9
Momentos sobrenaturais impressionam bastante, deixam o jogador tenso, dividido entre querer a ação ou evitá-la - 9.5

9.5

Incrível

Death Stranding Director's Cut é a versão definitiva de uma obra que já era excepcional quando foi lançada no PS4. As melhorias aqui parte por entregar um melhor ritmo e dinâmica para algumas das mecânicas acessíveis mais cedo em sua proposta, além, é claro, de toda uma melhoria técnica e visual, potencializado pelo poder de processamento do PlayStation 5, assim como seu vibrante e imersivo controle. Para quem ainda não conhecia essa a insanidade que é esse jogo, está é a melhor versão para tal. Talvez seja seja um estilo que vai agradar a todos, mas sem dúvida alguma é um obra ímpar, com muito originalidade e extrema criatividade.

Isso também pode lhe interessar
Botão Voltar ao topo

Adblock detectado

Dê uma ajuda ao site simplesmente desabilitando seu Adblock para nosso endereço.