Análise | Lost Judgment

Disponível para PlayStation 4 e 5 & Xbox One e Series

Lost Judgment é um jogo que abraça formalmente os gêneros ação e aventura em mundo aberto, mas que em seu desenrolar acaba revelando uma mistura de beat’em up 3D (na parte das lutas), RPG (em seu sistema de evolução de habilidades) e ainda possui grande foco na narrativa de uma história. Uma mistura que dá uma autenticidade a obra, enquanto também reproduz muito da cultura, vivência e costumes oriundos do Japão, as vezes até mesmo com certa sátira e bom humor.

Publicado pela Sega e desenvolvido pelo Ryu Ga Gotoku Studio teve sua data de lançamento em 24 de setembro de 2021 chegando para PlayStation 4, PlayStation 5, Xbox One e Xbox Series X|S – e ainda não existe qualquer indício de que, por ora, vá sair eventualmente em demais plataformas.

Vale também apontar que o título é uma sequência direta do jogo Judgment, lançado no Japão em 2018 e no resto do mundo em 2019, de forma exclusiva para PlayStation 4. Contudo em abril de 2021 o título recebeu uma versão aprimorada para os consoles de nova geração, passando então a ser disponibilizado também no PlayStation 5Xbox Series X|S e Google Stadia.

Judgment e Lost Judgment são spin-offs da franquia Yakuza (chamada no Japão de Ryu Ga Gotoku), uma famosa série de ação/aventura/beat’em up que conta com diversas versões e derivados. E antes que você se pergunte: não é necessário ter jogado Judgment para conseguir entender e jogar Lost Judgment, mas obviamente ter jogado o primeiro vai lhe deixar familiarizado antecipadamente com personagens e locações presentes nesta nova trama.

Último ponto inicial antes de adentrar na análise em si, é preciso dizer que infelizmente Lost Judgment não conta com localização em português, nem mesmo legendas, o que pode restringir o seu aproveitamento por quem não tenha nenhuma noção da língua inglesa. Muito do jogo fica engrenado na leitura de dicas e na análise de conversas com NPCs que vão lhe fornecer dicas do que fazer e aonde ir. Compreender sua história é parte importante de sua experiência.

Vale lembrar que ano passado a Sega lançou, meses após seu lançamento oficial, um patch de localização para Yakuza: Like a Dragon em nosso idioma. Contudo… aqui estamos, meses desde que Lost Judgment foi lançado, e até o momento não houve nenhuma menção da possibilidade do jogo receber novas localizações.

Entendendo a trama

Estamos exatamente em dezembro de 2021, no tribunal de justiça acompanhando o julgamento de Akihiro Ehara, um senhor acusado de assediar uma mulher em um trem lotado. Existe inclusive um vídeo onde podemos acompanhar sua tentativa de fuga e captura por pessoas que estavam no local. O vídeo se espalha como um vírus e rapidamente todos exigem a sentença máxima para ele.

No entanto, no exato momento de seu julgamento, Akihiro faz um comentário surpreendente: “Três dias atrás, um cadáver foi encontrado em um prédio abandonado em Yokohama”. Mas se ele estava preso há três dias e se esse assassinato estava em sigilo policial, como ele saberia de tal ato? Soltando essa bomba ele identifica o cadáver e fala que foi o responsável pelo ato, mas como Akihiro poderia ter cometido dois crimes ao mesmo tempo? Será que a sua prisão pelo crime sexual foi apenas um encobrimento para seu outro crime e dessa forma ele acabou manipulando todo o sistema de justiça Japonês? Sua advogada de defesa, Saori Shirosaki, chega a conclusão de que muitos detalhes estão sendo esquecidos e que algo não está batendo nessa história.

Para tentar solucionar esse caso entra em cena Takayuki Yagami, um detetive particular que também é advogado e que estará sob controle do jogador. Caberá a ele tentar solucionar esse caso. Esta investigação vai se estender até o final do jogo, tendo a todo momento novos detalhes, e obviamente reviravoltas, conforme vamos explorando a sua narrativa dividida em 13 capítulos (partes). De um modo geral temos eventos em Kamurocho (inspirada na cidade Kabukicho, de Tokyo) e parte em Isezaki Ijincho (esta por sua vez tendo como inspiração a cidade Isezakicho, de Yokohama).

A história é muito bem trabalhada e se foca em dois temas principais: a vingança, e como ela por si só consegue motivar injustiças no sistema judiciário em funcionamento, e o bullying. Obviamente abordar um tema atual e pesado como a prática de bullying tem todo um viés informativo, já que a cada dia que passa mais casos de bullying surgem a todo momento. Pela fato deste bullying se apresentar em um ambiente escolar, muitos podem pensar que ele é inocente e se baseia apenas em xingamentos e brincadeiras entre colegas de classe, mas os casos aqui tratados vão muito além disso, voltando-se para casos de intimidações, agressões físicas e ameaças, feitas dentro do sistema educacional japonês. Mais real que isso impossível.

Missões secundárias para aliviar o seu dia

Mesmo que a trama central de Lost Judment envolva temas pesados a respeito de bullying, assassinato e vingança, existem também partes mais leves para não cairmos numa vibe totalmente ruim. O jogo entrega uma série de missões paralelas que podemos fazer a nosso bel prazer explorar o mundo proposto e nos divertirmos um pouco, saindo da história principal por diversos momentos.

Contamos com os  side cases, casos paralelos à trama, relacionados a habilidade de detetive de Yagami, envolvendo obviamente o levantamento de uma informação comentada, como, por exemplo, algumas pessoas terem visto um “Homem Aranha” pendurado em um prédio nas proximidades. É, é esse tipo de descontração que as missões secundárias podem oferecer.

Mas para Yagami descobrir a verdade vai ser necessária toda uma pré investigação, a busca por pistas nos ambientes, análise de dados e até a execução de atividades bem fora do comum. Todas essas atividades vão obviamente aumentar a reputação da agência de detetives a qual Yagami está associado na região e lhe render experiência para o aprendizado de novas técnicas de luta para os combates.

Além destes casos paralelos temos também os school stories (histórias escolares) que são casos que estão sendo investigados pelo Clube de Mistérios da escola, ao qual Yakami acaba se vinculando após eventos desenrolados na história principal – e que não vem ao caso revelar os detalhes aqui para não estragar a experiência. Todos esses mistérios estão relacionados a burburinhos ouvidos nos corredores da escola e podem ser mais sérios do que você pode imaginar em um primeiro momento, exigindo toda uma busca e investigação, incluindo interações com outros clubes da escola.

Estas missões “escolares” são bem maiores do que os side cases e vão durar mais tempo, levando obviamente a recompensas mais generosas. Temos também clubes de robótica, basquete, boxe e fotografia, somente para citar alguns, todos vão lhe render momentos descontraídos, lhe tirar da rotina e obviamente fornecer uma vasta experiência para progredir no jogo.

Obviamente como em todos os jogos, essas missões secundárias podem ser ignoradas pelo jogador, mas completá-las acaba por revelar outras novas atividades extras e obviamente fornecer dinheiro e experiência úteis para a sua jornada na história principal.

Para fisgar mais ainda nosso tempo, ainda temos a possibilidade de visitar lojas para compra de equipamentos, a opção pegar um táxi (que aqui é a clássica “viagem rápida” para pontos já visitados do mapa) e até mesmo andar de skate pelas ruas (que também tem um sistema de pontuação que pode ser trocado por itens em uma loja específica), as lutas contra membros de gangues e até mesmo a possibilidade de jogar jogos clássicos como dardos, cassino, baseball, golf, mahjong e isso sem falar nos fliperamas/arcades do Clube Sega onde podemos jogar a versão arcade completa de jogos como Sonic the Fighters e Virtua Fighter 5 Final Showdown.

Se isso ainda não for o suficiente, na casa de Yagami contamos com jogos completos do Master System. Admito que essa parte teve todo um viés nostálgico para mim, ainda mais que o primeiro jogo que está disponível é o clássico Alex Kidd in Miracle World (a qual escrevi um review sobre sua versão remasterizada há alguns meses) e Fantasy Zone, um scrolling shooter que joguei muito quando era mais jovem.

Sistema de luta fluído e flexível

Lost Judgment conta com 3 estilos únicos de combate funcionando em harmonia, mas cada um deles tendo movimentações e intensidades completamente diferentes um do outro. Obviamente são essas diferenças que acabam deixando mais clara a necessidade de troca de um estilo pelo outro na hora das lutas contra determinados oponentes, se um estilo não estiver surtindo efeito, trocar para outro e experimentar é a única saída possível.

E é exatamente isso que deixa o combate flexível e fluido para o jogador. Deixe-me esclarecer um pouco sobre cada um destes três estilos e suas particularidades: Crane (garça) é o estilo focado no acerto de múltiplos alvos ao mesmo tempo e/ou na troca de alvos em intervalo de segundos, o que é ótimo para lidar com os grupos de inimigos nos ataques de grupo na escola ou nas gangues ruas pela cidade.

Já estilo Tiger (tigre) por sua vez tem como foco o acerto de um alvo único, ideal para lutas no 1 contra 1 e permite o carregamento de golpes, levando a acertos críticos nos oponentes. E o último dos estilos disponíveis, Snake (cobra) se concentra na realização de contragolpes, funcionando tanto para lutas contra um único oponente ou em lutas com múltiplos alvos simultâneos.

Claro que podemos trocar de estilos no meio da pancadaria, o que deixa o combate mais dinâmico e pode levar a lutas cinematográficas com a execução de golpes EX no meio dos combos de golpes mesclando os estilos.  Novos golpes vão ficando disponíveis com a liberação dos mesmos através da experiência adquirida ao cumprir as missões, sendo que temos que comprar os novos golpes ao custo de exp e alguns golpes são pré requisitos de outros.

Como mencionado, fazer as missões secundárias vai possibilitar novas experiências no jogo. Facilmente o jogador vai se parar a observar todas as técnicas de cada estilo e procurar conseguir a experiência necessária para liberar a maior quantidade o mais rápido possível. Afinal uma maior gama de golpes deixa o combate ainda mais fluido e intuitivo.

Todos estes estilos de Kung Fu usados por Yagami tem referências a golpes reais, o que me fez lembrar dos filmes protagonizados por Jackie Chan, onde todos os golpes são exagerados e por vezes até engraçados. Há inclusive um golpe especial que somente pode ser utilizado se Yagaki estiver bêbado, uma forte referência ao estilo Zui Quan, popularmente chamado de Estilo do Punho Bêbado, um wushu tradicional em que o lutador imita os movimentos de um bêbado, onde os golpes são criados  pelo impulso e pelo peso do corpo, contando com incrível fluidez nos movimentos.

Além dos três estilos ainda há a mecânica de parry. Toda vez que algum dos inimigos utilizar um golpe especial, o mesmo emite uma aura vermelha, toda vez que essa aura aparecer temos a oportunidade de realizar uma esquiva no exato momento do impacto do golpe inimigo, se transformando em um golpe especial (um contra ataque na verdade) que por sua vez vai reduzir drasticamente a vida do inimigo. Entretanto, se o jogador errar esse momento exato de desferir o mesmo, vai ocasionar em consequências catastróficas colocando a luta completamente a favor do oponente.

Propositalmente inimigos mais avançados da aventura não vão cair mediante qualquer sequência de golpes, eles vão partir pra cima e inclusive desviar de seus golpes. Logo o jogo nunca vai ficar na mesmice de entregar lutas fáceis como as que encontramos nas ruas da cidade, essas são realmente simples somente para dar o que fazer na exploração das cidades. As lutas mais tensas vão estar nas missões em si e no desenrolar da aventura central.

A parte gráfica

O mundo de Lost Judgment é muito bonito visualmente sendo repleto de detalhes. Temos tranquilamente a impressão de que estamos realmente em ruas reais do Japão quando caminhamos por Kamurocho, cidade já conhecida para quem já jogou alguns das Yakuza, e Isezaki Ijincho, também presente em Yakuza: Like a Dragon.

Essa impressão de que estamos em um ambiente real é mérito do motor gráfico Dragon Engine, correndo a 60fps constantes com excelentes efeitos de luz. O mesmo que já foi utilizado, com resultados também fantásticos em Yakuza: Like a Dragon, a qual sua análise você também pode conferir aqui no site.

Além de nos brindar com cenários praticamente reais, esta engine gráfica também faz milagres na exibição de rostos com um nível absurdo de detalhes. Repare nas imagens próximas ao rosto de Yakami… dá para ver os poros na dele. É um nível de atenção aos detalhes que dá toda uma imersão visual à experiência de jogo.

Considerações finais

Sem sombra de dúvida vale muito a pena dar uma conferida mais de perto em Lost Judgment. Mesmo sendo localizado 3 anos após o primeiro Judgment, não existe nenhuma barreira que impeça o jogador de aproveitar esta aventura sem ter jogado o título anterior, o que é ótimo para trazer novos jogadores e inclusive instigar a curiosidade de ver o que aconteceu com Yagami no jogo anterior. Dá para finalizar a sequência e depois ir atrás da aventura anterior, que aliás aparece em promoção nas lojas digitais dos consoles com certa frequência.

Lost Judgment é um jogo que pode facilmente lhe envolver por algumas dezenas de horas, caso você se empenhe em fazer tudo o que está disponível para ser feito, explorando seu mundo. Além de podermos gastar boas horas jogando clássicos antigos da Sega, disponíveis dentro do próprio mundo do jogo.

O sistema de combate, por meio da ação em tempo real, é muito fluído, diverso e agradável. É um show  à parte sair derrotando os inimigos com todas as combinações de golpes disponíveis e toda a coreografia de execução dos mesmos. Lembrando que é um sistema mais fiel à franquia Yakuza, diferente da aposta que a Sega fez em Yakuza: Like a Dragon, a qual optou por um sistema de combate com uma pegada mais próxima ao clássico RPG de batalha por turnos. Em Lost Judgment a pancadaria retorna ao formato mais tradicional, de briga de rua mesmo.

O único pesar que fica em relação à Lost Judgment sem dúvida é a ausência de localização em nosso idioma. Certamente esse aspecto deve afastar uma parte do público que poderia vir a ficar interessado pelo título, especialmente depois de Like a Dragon ter recebido tradução. Os diálogos são extensos aqui e a história tem uma importância tremenda para se importar com os personagens e entrar na experiência completa da trama.

Ao fim, Lost Judgment segue com louvor expandindo o universo da franquia Yakuza, mostrando que dá para apresentar novos personagens, novas narrativas, e novos meios de jogar dentro desse mundo criado pela Sega e a Ryu Ga Gotoku Studio, sem se focar no protagonista da série principal. O mundo proposto é gostoso de aventurar e é muito fácil de se deixar levar pelos casos, pelos elementos da investigação, pelos extras e, claro, pela pancadaria no melhor estilo kung fu!

Galeria

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Dando nota

Visualmente é muito bonito dos consoles de nova geração, apresentando visuais que em muitas partes beiram o realismo - 8.5
Sistema de combate com une habilmente a facilidade da execução com a uma diversidade de estilos de artes marciais - 9
Trama aborda assuntos atuais e interessantes, como bullying e vingança - 9
Muitas atividades extras para fazer alem das missões da história - 8.5
Peca por possuir apenas inglês e japonês como idiomas disponíveis - 6
Há bastante diálogos, o que pode afastar jogadores mais ansiosos por ação ininterrupta - 7
Mundo vivo onde o mesmo continua funcionando com ou sem a interação com o jogador - 8.5

8.1

Ótimo

Lost Judgment é um jogo que vai prender a sua atenção por longos períodos até a sua conclusão. Entrega uma ótima trama, bons personagens e não fica preso a necessidade de ter jogador o primeiro título da série. Tem bom sistema de combate em tempo real, toneladas de atividades secundárias e um belo mundo a se explorar. Sendo um spin-off de Yakuza, fortifica ainda mais a certeza de que esta série de jogos está a cada dia que passa mais firme tanto no oriente quanto no ocidente.

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