Análise | Clive ‘N’ Wrench

Disponível para PlayStation, Nintendo & PC

Clive ‘N’ Wrench foi lançado em 24 de fevereiro e está disponível para PlayStation 4, PlayStation 5, PC (via Steam) e Nintendo Switch, sendo um jogo de plataforma 3D que foi desenvolvido pela Dinosaur Bytes (incrivelmente feito por apenas uma pessoa, o inglês Rob Wass) e publicado pela Numskull Games.

Quem tem um pouco mais de idade sabe que na década de 90 a maioria dos jogos eram de plataforma e tínhamos ótimos exemplos deste gênero, com destaque obviamente para os mais famosos, como Super Mario 64, Sonic Adventure, Banjo-Kazooie e mais recentemente já nos anos 2000 com a franquia Ratchet and Clank.

A característica principal deste estilo de jogo, falando bem resumidamente, é sair correndo e pulando entre “plataformas” e obstáculos, coletando itens pelo caminho (bananas, moedas, argolas e etc) e chegar ao final de cada fase, geralmente onde encontramos um chefe para ser derrotado e assim dar procedimento a aventura. Então iremos a outra região e seguiremos a mesma premissa da fase anterior, com leves alternâncias nos desafios encontrados, características da fase e, obviamente, de inimigos.

Começo turbulento

Atualmente, causar uma boa impressão logo nos primeiros minutos é algo essencial, pois nem sempre os jogadores vão insistir para ver no que vai dar e muitos largam o jogo após poucos minutos, isso acontece com certa frequência quando o jogador não é “pego” pela aventura. Infelizmente Clive ‘N’ Wrench é bem áspero em seu início, onde seria importante conquistar os jogadores.

A aventura se inicia com uma cena de corte sem diálogos e sem muito foco, onde é necessário “captar” o que está realmente acontecendo, logo após essa cena você é simplesmente jogado no mundo central de Clive ‘N’ Wrench, de onde o resto do jogo vai se desenvolver, lhe contar o que está acontecendo e o que devemos fazer para avançar na jornada.

Veja bem, existe um tutorial aqui, mas ele está escondido e você precisa literalmente descobrir como completá-lo já que as instruções que deveriam lhe ensinar a jogar são pouco claras e você pode se sentir frustrado, já que são entregues de forma meio “vai lá e se vira”. E esse tutorial se estende por mais de 20 minutos quando o jogador finalmente entende o que deve fazer para prosseguir. Mas como disse antes, o jogo não consegue prender no começo e é depois dessa parte frustrante onde ele começa finalmente a melhorar e brilhar.

Clive ‘N’ Wrench é uma fusão dos melhores jogos de plataforma dos anos 90, canalizando de certa forma pequenas partes de jogos, de forma até muito parecidas. Posso citar alguns desafios de pular plataformas que parecem muito inspiradas na fórmula dos primeiros jogos de Crash Bandicoot: plataformas em sequência onde se cair tem que fazer todas de novo, aquela fórmula de ir pulando sem poder parar e nem errar pra pegar as caixas. Fora a semelhança com o conceito de dupla protagonista de Banjo-Kazooie, o que incluindo o fato de termos um companheiro (neste caso um macaco ao invés de um pássaro) em nossas costas também. Mas como falei a pouco, o jogo não consegue demonstrar isso em seus minutos iniciais.

Temos mais uma coisa aqui que pode incomodar um pouco. É que em geral é um jogo silencioso, o coelho Clive  e a macaca Wrench não falam nada. Nunca. E nem mesmo os vilões possuem falas. Os únicos que soltam o verbo aqui, e digo isso me referindo a balões de fala (não em áudio, no caso), é a coelha inventora Nancy e alguns NPCs específicos. Antes que eu me esqueça, o jogo possui localização para o português, então quando tiver falas e menus você vai entender tudo perfeitamente. No tempo que joguei não encontrei erros, então, pontos positivos quanto a localização para o nosso idioma.

A trama e os mundos perdidos no tempo

Clive ‘N’ Wrench se inicia quando vemos o maligno Dr. Daucus com a ajuda de sua general, Olga Chestycough, roubar um dispositivo capaz de realizar a famosa, e sempre desejada, viagem no tempo. Aqui a máquina capaz de tal dádiva havia sido desenvolvida pela coelha cientista Nancy Merricarp. De posse desse instrumento, o vilão viajou a 11 períodos de tempo diferentes a fim de coletar pedras antigas que dizem possuir um poder incalculável, além de aproveitar para fazer parcerias com celebridades da época, bandidos, jogadores, imperatrizes e etc.

Com isso o Dr. Daucus acaba adquirindo notoriedade no tempo, deixando sua marca em todos os períodos (incluindo estátuas suas em todas as fases). Quando Nancy percebe o roubo de sua máquina e se dá conta do perigo iminente, a inventora decide chamar seu primo Clive e sua aprendiz Wrench, e incumbe a dupla a usar sua geladeira que viaja no tempo (sim, é estranho, mas quem faz uma, faz duas, né?) e assim visitar os períodos que o Dr. Daucus bagunçou, coletando incríveis 10 mil relógios de bolso (aqueles usados pelos cavaleiros, onde geralmente possuía uma foto ou espelho na sua tampa) e moedas temporais antigas (110 ao todo) que servem para liberar o acesso às novas fases.

Há uma ressalva, Clive possui em sua mochila um radar que nos indica a direção desses relógios, então não vai ser tão complicado achar todos pelas fases. Já coletar eles, isso sim vai exigir um pouco de raciocínio do jogador, de como chegar até cada um deles. Mas para não perder a viagem, vamos aproveitar essas visitas temporais para derrotar os generais sob o comando do Dr. Daucus em cada época. Infelizmente a história não é aprofundada e fica meio que por isso mesmo.

A aventura se inicia no hub central, onde podemos visualizar todas as épocas, mas obviamente não podemos acessá-las, já que não temos nenhuma das “pedras temporais”. Se contarmos com o mundo que serve de tutorial temos 12 épocas de tempo distintas para visitarmos e explorarmos. Cada uma delas (tirando o tutorial que é uma fase mais curta) é composta por 2 áreas: uma fase de chefe e fase normal, onde somos livres para explorarmos, liberar passagens, coletar itens e realizar missões extras, como na primeira fase onde podemos ajudar uma abelha a reunir seus filhos.

Assim o jogador vai liberando passagens e novos caminhos ao realizar determinadas coisas, como empurrar uma bola de boliche que vai bater em uma tampa e abrir uma nova rota. Mas, como eu disse anteriormente, não existem indicativos dessas atividades, então podemos ficar trancados por um tempo até acharmos essas interações especiais pelas fases. Todas as fases tem seu término quando chegamos na geladeira temporal e então podemos viajar novamente dando continuidade a jornada.

A respeito das áreas de chefes, quando entramos em um período de tempo encontramos 2 entradas, uma para a fase normal e outra para a fase do chefe. Mas a do chefe precisa de pedras para ser aberta e tem só o chefe dentro. Você joga a fase normal onde tem as missões e então coleta as pedras que vão abrir a fase do chefe. Não dá para chegar a um mundo do jogo e ir diretamente para o confronto de chefão.

Temos capangas do Dr. Daucus espalhados em todas as linhas do tempo, então teremos inimigos em todas as fases. Mas eles não exigem muita habilidade para serem derrotados, bastando pular neles como faríamos em um jogo do Mario, ou atacarmos eles com uma batida com nossa companheira Wrench que também funciona como uma arma ao ser girada contra os adversários. Lembrando que a macaquinha também funciona como um espécie de helicóptero, ao pularmos e pressionarmos o mesmo botão de ataque iremos girar ela e retardar a queda, o que podemos usar para voar até alguma área mais distante ou para cairmos em uma plataforma mais baixa em segurança controlando melhor a área onde vamos descer.

Entre os mundos/tempos visitados pela dupla, temos ideias marcantes e pitorescas como uma Londres com uma versão mais “amigável” do famoso Jack o estripador, uma época mafiosa onde visitamos um pântano nos Estados Unidos, uma visita ao Egito e suas pirâmides, um porto localizado na Grécia antiga, uma vila com piratas, um mundo de neve (como temos em todo jogo de aventura, para não fugir à regra) e alguns castelos localizados em pontos distintos do tempo. Algo legal, e que chama a atenção de forma positiva, é tanto Clive quanto sua parceira Wrench se vestem adequadamente para cada época, o que é um toque simples mas que funciona muito bem.

É nessas fases temporais que o jogo faz a sua parte de divertir e deixar o jogador com vontade de explorar tudo, de descobrir os segredos escondidos em cada fase. Vou dar mas um exemplo, na fase do pântano que nos leva a uma cidade “gangsters” o taxista local pede nossa ajuda alegando que seu carro foi roubado por um lacaio do Dr. Daucus e que nos recompensará com algo de valor (uma moeda temporal) caso consigamos parar o carro dele, e é isso… ele não fala exatamente o que podemos fazer, mas se observarmos os prédios, em algum deles teremos algo para derrubar no caminho do carro, e acabar com a farra do monstro que roubou o táxi.

Na fase do Egito devemos subir até o alto da pirâmide a fim de encontrar a Cleópatra e dar andamento a aventura, mas como vamos subir lá em cima? Basta solucionarmos um labirinto com a ajuda de uma tal de Laura Cruz, notadamente uma homenagem bem legal a Lara Croft. É nesses pequenos detalhes que o jogo brilha, ele te dá dicas bem limitadas do que fazer, mas se você explorar a fase toda vai achar dicas escondidas e conseguir prosseguir tranquilamente. Nessa fase do Egito, ainda exemplificando, precisamos localizar alienígenas que foram raptados por Cleópatra e estão sendo mantidos como escravos por toda cidade, ao localizarmos todos, a nave deles abre caminho e libera acesso a outra parte da fase. É como o jogo vai se revelando que o torna bem interessante. São essas pegadas que conquistam o jogador.

Por fim, outro aspecto, que talvez possa chatear um pouco, é que não lutamos diretamente contras os chefes. Eles tem armadilhas que devemos voltar contra eles ou lacaios que vão nos enfrentar em ondas até derrotarmos todos e vencermos o combate, não existe um embate direto contra os chefões. Acabou, ao menos pra mim, sendo um balde de água fria.

Execução gráfica

Clive ‘N’ Wrench é um jogo que ficou em desenvolvimento por longos 10 anos. Mazelas de um desenvolvimento independente, totalmente compreensível.  Só que isso que nos dá todo um motivo para as mudanças gráficas que encontramos dentro da aventura. Chegamos a ter momentos onde os gráficos são lindos e bonitos, o que condiz com a geração atual ou a anterior, porém em determinados momentos parece que estamos com um jogo de PSOne nas mãos, e não pela nostalgia, mas sim pelos problemas encontrados.

Vou exemplificar algumas destas gafes técnicas. Ao se pendurar em beiradas as mãos de Clive as vezes não encostam nas plataformas, da forma como era antigamente já que determinar o ponto de encontro das estruturas era mais complicado. Em outros momentos, vamos atravessar partes do cenário e não iremos parar nos obstáculos, entrando para dentro deles inclusive, nada que vá trancar o jogo, mas você consegue ver que aconteceu.

Tocar nos inimigos obviamente vai causar dano, mas o ponto de impacto não é muito visível e não veremos exatamente quando formos atingidos na muvuca de alguns confrontos. A câmera às vezes nos coloca em situações onde acabamos não vendo exatamente o que vem ao nosso encontro. Há mais uma coisa: os inimigos muitas vezes ficam jogados no chão de forma estranha até que somem ao sair e voltar para a área. Sabemos que existem formas mais “normais” de lidarmos com inimigos derrotados, inclusive acho mais aceitável quando eles simplesmente desaparecem quando são derrotados. Não é algo que vai causar problema na jogabilidade, mas é estranho visualmente.

Deixando de lado gráficos e essa parte da execução técnica, vou aproveitar para dizer que a música do jogo é sempre muito adequada à situação e os efeitos sonoros cumprem o seu papel. Nesse aspecto não tenho críticas, e achei tudo bem agradável nessa parte de trilha sonora.

Considerações finais

Mesmo diante de algumas críticas, acredito que Clive ‘N’ Wrench vale a experiência retrô, e parece melhor quando apreciado em doses menores diariamente, por um tempo maior. Obviamente, conseguir vencer seus minutos iniciais monótonos já é uma prova digna dos mais fortes. Mas não deixe a impressão inicial afastá-lo do que o jogo vai lhe proporcionar mais para a frente. Depois de ter largado ele por um longo período, voltei novamente e me diverti por horas em uma tarde de um domingo qualquer. Jogar 1 ou 2 fases é o que recomendo em uma sessão de jogo, mais do que isso pode ser cansativo e tirar a vontade de explorar cada canto das fases, e são exatamente nesses cantos onde vamos encontrar segredos e referências que podem passar despercebidos.

Seria errado não reconhecer que este jogo é uma homenagem a todos os jogos de plataforma que fazem sucesso há mais de 25 anos. Devemos levar isso em conta e lembrar que talvez com um pouco mais de cuidado e cozimento adequado, Clive ‘N’ Wrench poderia ter feito frente a muitos jogos em seus auges. Os problemas técnicos, o baixo orçamento, o tempo em que ficou em desenvolvimento, tudo isso é compreensível dentro da esfera dos jogos independentes, sem a mesma estrutura e orçamento dos grandes blockbusters da indústria. O que o desenvolvedor fez aqui, com tão pouco, é digno de elogios e atenção. E por isso esta análise e sua indicação para que nossos leitores possam conhecer a obra.

Inclusive não é um universo que precisa acabar em um único jogo. Até consigo imaginar uma sequência a qual os protagonistas poderiam viajar para mundos no futuro. Seria, de certa forma, um desperdício não usar eles novamente, talvez com uma nova aventura e melhorando os deslizes que acontecem aqui. O aprendizado certamente faz parte quando se pensa em potenciais sequências. No mais, Clive ‘N’ Wrench é uma interessante experiência retrô de tempos passados em que esse gênero estava no holofote das atenções. Valeu, e muito, pela nostalgia proporcionada.

Galeria

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Dando nota

Curva inicial desastrosa, é preciso ignorar os minutos iniciais para não desistir antes da hora - 5
Bacana homenagem aos clássicos de plataformas 3D que deram o pontapé ao gênero - 7.5
Visualmente é bonito e tem charme, mas tem alguns problemas técnicos envolvendo o ambiente em si - 6.5
História é bem rasa e boba, mas tem simpatia, afinal viajar no tempo em uma geladeira tem seu apreço - 7.2
Sem diálogos em áudio, contudo traz textos muito bem localizados em português - 8
Ter que explorar a fase para achar referências e desvendar os mistérios é bem divertido - 8
Batalhas contra os chefões finais poderia ser mais elaborados - 7

7

Retrô

Clive 'N' Wrench tem seus problemas, que podem até não serem poucos e não podem ser completamente ignorados, mas deixar de apreciar essa obra que presta uma homenagem aos jogos e aventura do passado somente por isso seria errado. Localizado em português e com uma jogabilidade retrô, os mundos são criativos e o jogo engata após sua curva inicial. Para fãs desse gênero de plataforma 3D, é diversão garantida.

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