Análise | Clair Obscur: Expedition 33
Disponível para PlayStation 5, Xbox Series X|S & PC

Clair Obscur: Expedition 33 entrega uma experiência curiosa, que emula uma antiga fórmula dos RPGs de turno, mas refinada e adaptada ao ritmo e velocidade dos atuais jogos do gênero, enquanto construi uma brilhante narrativa, que apresenta um universo intrigante, uma fantasia obscura e personagens cativantes, que impulsionam o jogador para dentro de uma aventura repleta de surpresas. Um título que facilmente irá concorrer ao melhor jogo lançado este ano, fácil, fácil.
O jogo foi lançado no último dia 24 de abril, chegando somente aos consoles da atual geração, o PlayStation 5, Xbox Series X|S e PC, sendo que logo em seu lançamento o título também foi disponibilizado no serviço do Xbox Game Pass, o que o torna ainda mais acessível ao mercado brasileiro, a qual os preços dos jogos tem sido muito debatido nestas últimas semanas.
Seu desenvolvimento é a primeira obra do estúdio francês Sandfall Interactive, fundado em 2020, a qual diversos de membros de sua equipe são ex-funcionários da Ubisoft, ou seja, possuem experiência no ramo, e justamente provam uma tremenda competência com uma imensa proposta de um RPG de turno como este, com ares de uma produção AAA, com uma qualidade invejável para estúdios como Square Enix, um das grandes maestros desse gênero. Elogios também a Kepler Interactive, publisher de jogos, e que acreditou no projeto e se tornou a distribuidora global da obra.
Bacana também mencionar que Clair Obscur: Expedition 33 chega em todas as plataformas mencionadas com uma completa localização em nosso idioma, através de legendas em todos os menus, tutoriais e diálogos da narrativa de sua campanha. Não há dublagem, mas o charme da dublagem em inglês, com todos os sotaques característicos de uma inspiração francesa, torna o áudio do jogo muito agradável. Mas o trunfo certamente é estar localizado, inclusive todo lindo menu de batalha do jogo, com todas opções e explicações de golpes e especiais, tudinho em um bom e compreensível português. Não só uma tradução, mas uma belíssima adaptação ao nosso idioma. Isso torna um gênero, normalmente com potencial de ser complicado a parte de uma público, mais fácil de compreender, o que dá muito mais acessibilidade!
Calamidade em contagem regressiva
Clair Obscur: Expedition 33 traz um conto sombrio, com um toque inspirado no famoso ambiente da belle époque francêsa, que vem de um renomado período histórico em que Paris, assim como grande parte da Europa, vivenciou uma sociedade tomada por um senso de crescimento artístico, científico e cultural, antes dos horrores da Primeira Guerra Mundial trazer um momento mais duro e triste a história do mundo.
Contudo, isso é só uma pequena influência artística para compor elementos do mundo, vestuário de personagens e sutis toques que definem o estilo gráfico que a Direção de Arte do game pega como inspiração. Até porque, o jogo traz uma trama de fantasia sombria, totalmente ficcional ao que de fato foi a Belle Époque.
A trama se passa na ficcional ilha de Lumière, isolada do mundo, mas claramente inspirada em Paris. O jogo inclusive abre demonstrando o que seria algo parecido com a famosa Torre Eiffel, porém completamente retorcida, como se algo sobrenatural tivesse acontecido com ela.
Sem detalhar demais, a narrativa deixa claro que as pessoas da ilha estão presas em um oceano, após um evento chamado de Fractura, em que não há mais nada ao redor, exceto por uma outra ilha, a qual vivem estranhos monstros, denominados Nevrons, e uma entidade chamada Artifície que está fazendo uma contagem regressiva em um enorme monolito que pode ser vista até mesmo de Lumière. E esse número diminui a cada ano.
67 anos se passaram desde que tudo isso começou, e atualmente a pedra está no número 33. E como essa contagem afeta quem vive na ilha? Pois bem, as pessoas só podem viver até o número em que está sendo exibido na pedra, e como esse número diminui anualmente, isso também significa que as pessoas estão vivendo cada vez menos. Irá chegar um momento que a extinção de todos os habitantes da ilha será inevitável.
Com essa sina afetando a cidade toda, seus habitantes estão encurralados em um cenário em que não há muito para onde fugir. Portanto, todas as pessoas que se aproximam do último ano de vida podem optar por dois caminhos: viver esse último ano na cidade ou se juntar a uma expedição que vai até a misteriosa ilha para tentar acabar com a maldição ou encontrar qualquer resposta que possa ajudar os habitantes que ficaram em Lumière, na tentativa de que seus filhos e familiares não passem pelo mesmo destino cruel. Mas ninguém nunca voltou da ilha desde que as expedições começaram…
Entendido o contexto do mundo, e da situação de calamidade, eis que entram os personagens que darão mote a toda a aventura. Alguns irão surgir num momento mais avançado da aventura, e cativarão o jogador tanto quanto, mas no começo da campanha, o foco narrativo permanece em três personagens centrais: Gustave, Sophie e Maelle.
Tudo começa na véspera do final do ciclo 34, em um evento que os cidadão de Lumiére denominam Gommage. O evento, apesar de parecer festivo, guarda uma melancolia do tamanho do coração de todos ali, porque é o último dia em que todas as pessoas com 34 irão viver. Quando o monolito da Artífice fizer sua contagem, e o número 33 surgir, todas as pessoas com 34 se tornaram cinzas e desaparecerão do mundo. Sophie, o grande amor de Gustave, tem 34 anos. E o jogador acompanha seu último dia neste mundo cruel.
Logo também descobrimos que Gustave não é qualquer pessoa nessa sociedade. Ele é uma espécie de mestre, professor e treinador, preparando as pessoas da cidade para suas expedições quando chegar o momento, contudo, a hora de Gustave chegou, pois ele é quem agora tem o último ano da sua vida iniciado, aos 33 anos. A expedição 33 está para partir a enigmática, e perigosa ilha.
Dentro deste grupo está a jovem Maelle, de 17 anos! Aprendiz de Gustave, Maelle diz que não tem mais porque viver em Lumiére, e portanto, irá partir com os membros da Expedição 33 para a ilha. Gustave não consegue persuadi-la do contrário. E com isso assume uma grande responsabilidade de proteger a jovem, com a esperança de que desta vez, todos poderão vencer os desafios e cumprir a meta de encerrar esse pesadelo em contagem regressiva.
Porém, estamos em um RPG, o que significa que nem tudo é simples e fácil. A jornada até a ilha segue sem grandes problemas, mas assim que toda a Expedição desembarga, uma enigmática figura surge: um homem idoso! Como é possível, se ninguém acima de 33 anos está vivo? Gustave e os demais membro ficam perplexos e baixam suas guardas. O grande erro da Expedição 33 tem início.
O homem velho revela que sua bengala é tão perigosa quanto a mais afiada das facas, e dizima todos os membros da expedição. Alguns fogem, outros se escondem, mas o destino de muitos é selado aqui, sem nem ao menos adentrarem a ilha. Gustave vê a figura da morte diante de si, mas antes de receber seu abraço, um membro da tribulação, um de seus aprendizes, o puxa e o arremessa para uma pedra, e tudo escurece e Gustave apaga.
O tempo passa e Gustave acorda, e está sozinho. O homem misterioso sumiu, muitos não sobreviveram. Maelle não está entre os corpos. E é assim que a jornada de Clair Obscur: Expedition 33 tem início. Gustave agora está sozinho, a ilha que não lhes deu qualquer chance, mas nem todo mundo está na praia de desembarque. Há sobreviventes? Será que Maelle… está por aí? Tudo que lhe resta agora é seguir, entrar na ilha e encarar todos os perigos que estão lá. Lendas e contos se tornam verdades, mentiras surgem, mistérios que não fazem sentido se apresentam, companheiro são encontrados e o homem idoso retornará, mas o que é ele?
Pois então… Isso é uma aventura de RPG de alto nível! Um universo rico em detalhes, construído com muita fantasia, com perigos iminentes, personagens cativantes, um protagonista torturado por tudo que errou e perdeu e muitas entidades, criaturas e seres fantásticos além da sua imaginação. É uma qualidade narrativa que, sinceramente, não via há muitos anos, e que rapidamente me remeteu aos melhores anos dos melhores Final Fantasy. Isso é fenomenal!
Turnos fantásticos
Após construir um incrível mundo e apresentar uma narrativa que faz o jogador se importar com eventos e personagens, elemento tão importante em um RPG, eis que é chegado a hora de abordar sobre o segundo elemento estrutural que torna qualquer jogo desse gênero interessante e empolgante: o sistema de batalha.
Clair Obscur: Expedition 33 é um RPG que emula a antiga fórmula das batalhas por turno, ou seja, cada personagem tem sua vez de realizar uma ação, enquanto os demais aguardam seus respectivos turnos. Inimigos também tem seus próprios turnos, e não são intercalados com o do jogador. Ou seja, em cada rodada, um lado joga com todos seus personagens e só, então, é a vez do lado oposto.
O sistema de turnos já foi duramente criticado na era moderna dos jogos, em que o Action-RPG e a ação em tempo real tomou conta de boa parte do que representa o atual gênero RPG (Role Playing Game), contudo, de tempos em tempos, estúdios revisitam a fórmula e a misturam com elementos atuais, resultando em um modelo mais eletrizante, com ritmo e dinâmicas únicas, deixando de lado aquelas batalhas lentas e paradas dos clássicos antigos. O jogo impressiona muito nesse quesito.
Não que Clair Obscur: Expedition 33 chegue a reinventar a roda, entretanto, o sistema observa tantos modelos de grande sucesso, que resulta em um sólido sistema, eficaz, ágil, interativo e, acima de tudo, extremamente divertido. A começar por um ótimo design de tela de combate e ângulos de câmera, que claramente tem como inspiração os atuais RPG da Atlus, como Persona 5. Isso dá vida ao conceito estático de uma batalha por turno.
Não só isso, mas a agilidade como a ação ocorre, de um golpe em segundos. O jogador ativo o comando, o personagem entra em uma veloz animação, bate no inimigo e retorna sua posição de original, tudo em um piscar de olhos. Isso é extremamente importante para não fadigar o jogador depois de milésima vez que ele utilizar o mesmo golpe.
A interação também é outro elemento presente nesta ação do turno de cada personagem. Porque todo ataque, todo golpe especial, toda habilidade ativada tem um Quick Time Event (QTE), em que o botão que ativa a ação precisa ser pressionado no tempo correto para ativar um bônus de efeito. Um indicador na tela surge quando isso ocorre, e é super rápido. Piscou, perdeu.
E é sempre o mesmo botão, então não é um daqueles sistemas chatos em que o QTE tenta sacanear o jogador. O conceito é semelhante a RPGs clássicos, onde o jogador pressionava um botão na hora de atacar ou receber um ataque, para que ou o ataque causasse um crítico ou causasse menos dano se o inimigo o acertasse. O que os desenvolveres fizeram foi colocar expressamente um indicador na tela para que o jogador aperte no momento exato. Ótimo!
A interação também continua quando são os inimigos que estão em seu turno. Todo ataque inimigo dá ao jogador opções para lidar com esse momento de alguma forma. Seja realizando uma esquiva que anula completamente o dano que o personagem receberia, seja realizando o movimento de aparar, que segura o ataque do inimigo e faz com que o personagem contra ataque ele na mesma hora. Claro que tudo isso exige exatidão no tempo de reação. Esquivar é mais tranquilo de se conseguir, enquanto aparar requer mais atenção.
E o contra ponto desse sistema é que como se esquivar e não receber dano é muito fácil de se realizar – talvez só mais complicado quando surgem novos inimigos que fazem uma firula antes de atacar – isso se traduz em uma estrutura que basta dois ou três ataques para que seu personagem morra. O dano é muitas vezes brutal quando não se esquiva. E aí vem o desejo do jogador querer contra ataque realizado o aparar, que é mais difícil, o que pode ser um revés, porque ao errar, você toma dano.
Percebe como é engenhoso o sistema? Ele te mostra como não tomar dano, mas também como causar um dano massivo e quebrar defesas de alguns inimigos, contudo, ao fazer isso, ele cria justamente o risco que não existe se você só esquivar, que o de sofrer grandes golpes dos adversários.
Ainda nas interações, o jogo também tem outro momento muito bacana, que ele indica certos ataques dos inimigos em que o jogador precisa pular, pois esquivar ou aparar não segura estes ataques. E ao conseguir saltar, realizando então a esquiva aérea, é dado a possibilidade de apertar outro botão e atirar com todos seus personagem no inimigo que lhe atacou. O efeito da cena nestes momentos é um espetáculo.
Tudo isso que apresentei é a estrutura básica do jogo, mas não é o todo. Ainda há um tipo de ataque, realizado com arma de fogo, que não conta como turno da ação (ou seja, o comando que dá o fim do turno de seu personagem). Isso significa que é possível atirar múltiplas vezes nos inimigos, antes de usar o ataque de turno, o chamado ponto da ação.
Claro que esse tiro causa um dano pequeno, comparado com os ataques que encerram a vez do personagem, entretanto, a utilidade desse recurso é sagaz, porque permite quebrar escudos, assim como acertar pontos fracos de alguns inimigos, causando, aí sim, um dano considerável. Claro, é preciso mirar e acertar, e as vezes estes alvos são móveis. E conforme o jogo vai mostrando suas ferramentas, sistemas vão se combinando com outros. Assim, as vezes atirar em um inimigo tem um efeito de preparar e turbinar o ataque principal de certos personagens da sua equipe. E vou chegar nisso daqui a pouco.
Pontos de Ataques e os Pictos!
O que preciso explicar agora é o chamado sistema de Pontos de Ataque, ou simplesmente PA, que é um elemento essencial para muitas das mecânicas presente no sistema de batalha de Clair Obscur: Expedition 33. Isso porque certas ações, como o uso de habilidades custam pontos. Atirar, mecânica explica acima, também custa 1 PA por disparo. Sem estes pontos, o jogador fica limitado apenas a utilizar o Ataque Básico, que é a única ação ofensiva que não precisa dos pontos.
E como se obtém estes pontos? O jeito básico é atacando. Um ataque padrão rende 1 PA, contudo, existem outras maneiras, como esquivar e aparar com perfeição. Quebrar escudos e até mesmo usar habilidades e itens que geram novos pontos de ataque. Contudo, a melhor forma de gerenciar o ganha de PA é utilizando outro sistema chamado Pictos!
Pois então… pictos são basicamente perks, ou seja, benefícios que podem ser equipados nos personagens que lhe rendem certas vantagens ou bônus. Cada personagem tem três slots para equipar pictos. E muitos deles envolvem os pontos de ataque. Começar o turno com 1 ponto adicional ou ganhar 3 pontos ao eliminar um inimigo, são alguns exemplo, entre outros que já citei, como quebrar escudos e esquivar com perfeição.
Novo pictos encontrados ao longo de toda a aventura, explorando o mundo, coletando itens e derrotando inimigos fortes e chefões de mundo. Então a todo momento o jogador irá encontrar um novo. Além disso, esses benefícios também não envolvem somente o sistema de PA, mas todo o sistema de batalha em geral. Por exemplo, causar mais dano se o inimigo estiver com queimadura, ter um adicional de 50% de ataque básico se você atirar no inimigo antes, recuperar parte da vida se aparar um ataque do inimigo, e assim por diante.
Com tantos pictos interessantes, talvez você possa pensar ser chato ter apenas três slots para cada personagem, sendo que o picto ativado não é um benefício em equipe, ou seja, ele só funciona para o personagem a qual está equipado. Só aí, os desenvolvedores pensaram adiante e inseriram um recurso chamado pontos de Luminas. E o que seria isso? Uma maneira de expandir pictos e equipar eles além dos três slots!
Funciona assim, primeiro o jogador precisa assimilar o picto. Isso ocorre simplesmente o equipando em um personagem e usar em algumas batalhas. Após algumas rodadas o jogo irá avisar que você aprendeu esse picto, ou seja, você não precisa mais equipar ele nos slots fixos. Todo personagem tem um sistema chamado pontos de luminas, e eles também permitem equipar pictos já apreendidos. E se um personagem aprende, qualquer um pouco equipar tal picto com seus próprios pontos de luminas, observando, claro, que cada picto tem um certo custo de pontos.
Na prática, isso se traduz no sistema de uma forma que aquele picto que rende 1 PA em uma esquiva perfeita, uma vez aprendido, pode ser equipado em todos os membros da equipe, ao custo de 2 luminas cada um. E essa customização não é fixa. Equipou, mudou de ideia e quer reutilizar estes pontos? Você pode!
Além disso, conforme a campanha progride, o jogador vai encontrando pontos de luminas em itens espalhados pelo ambiente, assim como cada personagem também aumenta um pouco sua contagem sempre que sobe de level. Ou seja, se você começa equipando apenas três pictos nos slots fixos, logo irá se deparar com 15 pictos adicionais equipados com pontos de luminas. Podendo trocar estes benefícios de combate conforme a necessidade de novas estratégias forem se fazendo necessário.
Entendido os Pontos de Ataque (PA), os Pictos e os Pontos de Luminas, agora consigo explicar um pouco sobre os personagens e suas habilidades. Isso porque cada personagem jogável em Clair Obscur: Expedition 33 tem mecânicas próprias e são bem diferentes entre si. É preciso entender suas mecânicas e como gerenciar seus golpes e habilidades, afim de potencializar seus atacas em batalhas, especialmente contra inimigos poderosos que possuem uma grande quantidade de vida ou muitos escudos.
Não irei explicar todos os personagens presentes no jogo, até porque muitos só são desbloqueados em momentos bem a frente da aventura, e isso poderia ser considerado spoiler. Basta entender que todo personagem tem um sistema que pede que o jogador monte uma estratégia de uso de seus recursos e habilidades que irão necessitar combinar turnos para que haja uma crescente de status ou poder, afim de desengatilhar o pleno potencial do personagem.
Gustave, por exemplo, é um personagem que possui o que o jogo chama de sobrecarga! Ele precisa causar 10 ataques físicos no inimigo para acumular o efeito que dá nome a sua habilidade. Quando Gustave chega a esse nível máximo, ele pode usar uma habilidade catastrófica para o inimigo, incluindo chefões, onde ele descarrega uma poderosa descarga elétrica.
Mas só utilizar o ataque normal faz com que seja acumulado somente um ponto por turno, o que demoraria demais. Então existe uma habilidade que permite usar 5 ataques físicos em sequência. Mas isso custa PA, claro. Usar essa habilidade em 2 turnos sequências fará Gustave entrar em sobrecarga, mas todos seus PA estarão esgotados, o que o inviabiliza o poderoso golpe no terceiro turno.
Aí é que entra a importância dos pictos, ganhos de PA através de seus benefícios, além de conseguir fazer esse balanço entre atirar (o que também perde pontos de ataque) e manter a condição de sobrecarga, ainda que isso custe alguns turnos apenas atacando de forma básica para guardar ou ganhar pontos de PA.
Mas isso é apenas a estrutura de combate de Gustave e não se aplica a outros personagens. Lune, por exemplo, a segunda companheira a entrar na equipe durante a campanha, tem uma classe de luta mais semelhante ao de um mago. A personagem possui diversas habilidades elementais, sendo a de queimadura por fogo, uma das mais efetiva no começo do jogo.
Cada vez que Lune usa uma habilidade, ela ganha uma esfera elemental que fica em uma roda de energia, que vai acumulando poder e vai sendo usado em habilidades posteriores, sendo que alguns destes golpes especiais são potencializados se Lune tiver esferas de certos elementos específicos. Não só isso, mas algumas habilidades podem apresentar efeitos em cadeia, como queimar um inimigo para que no turno seguinte usar um golpe de gelo e assim maximizar o dano desse segundo ataque.
E claro, tudo isso custa PA, mas sendo uma “maga”, algumas habilidade podem ser utilizadas para carregar pontos de PA adicionais para o próximo turno. Lune também tem a habilidade de curar e restaurar um pouco de vida de seus companheiros, o que a torna extremamente útil em combate. É uma excelente personagem de suporte, causando dano de elementos nos inimigos e recuperando saúde de companheiros.
A terceira personagem que gostaria de comentar aqui é Maelle. O sistema dessa personagem talvez seja um pouco mais complexo inicialmente, mas uma vez dominado, é muito provável que Maelle seja a responsável pelo golpe final em muitos chefões do jogo, especialmente quando estiver difícil acumular a sobrecarga de Gustave.
Isso porque a jovem tem um sistema de combate focado em postura. Funciona assim, ao final de cada turno, a depender da habilidade que Maelle usar, ela entra em um estágio de postura que definirá como será o dano que ela causará no próximo turno. E há três estágios de postura: defensiva, ofensiva e virtuosa. Os nomes de cada postura já são bem sugestivos, então claro que na defensiva ela toma menos dano, na ofensiva seu ataque é potencializado, mas o interessante mesmo é o estágio virtuoso! Neste último Maelle causa 200% de dano, podendo ser maximizado com outros benefícios de pictos ativados, o que resultam em golpes poderosíssimos!
O grande revés da postura virtuosa é que habilidades que colocam Maelle nesse estágio custam mais PA, sendo que o estágio de Defesa dela garante que ela recupere PA gasto. Ou seja, tem que pensar nesse balanço entre ter pontos de ataque, afim de conseguir manter ela no estágio virtuoso em um turno em que consiga atacar chefes. E claro, nesse estágio, sua defesa é ridícula, então inimigos vão atacar ela, e uma esquiva errada pode nocautear a personagem, impedindo assim seu ataque virtuoso no turno seguinte.
Dentro de toda essa estrutura de carregar ataques, planejar turnos e manter pontos de PA, preciso mencionar que inimigo mais poderosos, e não apenas chefes, possuem um sistema de ponto de escudo. Ou seja, o inimigo carrega 3, 4, até 8 pontos de escudo. Isso significa que o jogador precisa bater nele esse tanto de vezes (do escudo que tiver) até que ele volte a sofrer dano. Então, não adianta usar o sobrecarga e o ataque virtuoso em inimigos com escudos. E você pode atirar neles, cada tiro retira um ponto de escudo, mas fazer isso custará seus PA e assim vai inviabilizar o ataque poderoso, porque você vai estar sem PA.
Percebe como o jogo é sagaz em todos seus sistemas, que parecem complexos, mas são tão bem planejados, que uma estrutura casa com a outra, interliga tudo e torna todo o sistema de combate interessante, dinâmico e, acima de tudo, muito inteligente. Essa é a beleza dos combates de turno criados para esta aventura.
Considerações finais
Clair Obscur: Expedition 33 é sem dúvida alguma um evento. Trata-se de um título desenvolvido com paixão por uma equipe apaixonada pelo gênero, inspirada em grandes clássicos, porém sem nunca ter a intenção de se prender no passado, em fórmulas arcaicas e que não combinam com o estilo atual dos jogos de RPG. É uma obra que observa sim o passado, mas traz tudo para tempos modernos.
A análise trabalhou muito dois aspectos de suma importância ao gênero: narrativa e combate, porém, é claro que outros elementos também são importantes, mas são meios para um fim, no resultado aqui debatido. Por exemplo, a exploração do mundo é excelente. Os caminhos não são tão lineares, a muitas vezes, em certas áreas o jogador vai se perguntar qual o caminho correto. Volta, olhar bifurcações fará parte da experiência, e nada disso é chato ou cansativo.
Gosto também do sistema adotado aqui para trabalhar cada mundo (área) de forma independente. Isso se traduz num esquema em que inimigo derrotados não retornam enquanto o jogador não sentar em frente ao acampamento e restaurar sua saúde. Perfeito para a exploração isso. Inimigos são fixos, então nada de combates aleatórios constantes, o que é bom para o ritmo do jogo. O jogador que deseja fazer grinding, melhorar seu nível, tem a liberdade de reiniciar áreas quantas vezes desejar.
Além disso, com esse sistema, isso significa que o dano é persistente entre os combates. Sua vida continua em baixa após uma batalha, até que se use um item, uma magia de cura ou descanse em um ponto de acampamento (reiniciando a área), sendo que cada mundo tem três a quatro destes pontos, que são usados também para atribuir pontos de nível, adquirir habilidades e restaurar toda a vida dos membros da sua equipe. E uma vez encontrados, os acampamentos também servem como pontos de viagem rápida.
O mapa de mundo, que interliga as áreas de exploração e combate, além de progredir pela história, é bonito e interessante, porque também apresenta inimigos pelo mapa, ícones de interação que abrem atalhos pelo mapa, assim como itens escondidos. Até aqui a exploração é incentivada.
Elogios também precisam ser feitos em relação a Direção de Arte do jogo. Clair Obscur: Expedition 33 é visualmente um soco no estômago em certas momentos. Ambientes magníficos, com cenários de tirar o fôlego que usam e abusam do conceito de fantasia sombria e fantástica. É um jogo que dá um tom daquela impressão de que muitos jogos atuais precisam entregar, mas não chegam nem perto desse resultado. A imersão do mundo te leva para dentro da tela da televisão. É absurdo.
É notável o cuidado com detalhes. Roupas dos personagens repleto de mínimos detalhes, diferentes tipos de espadas, armas, assim como os efeitos de partículas de golpes em meio a ação. Sombra, luz, reflexo, sensação de profundidade, de impacto, de velocidade, tudo isso os gráficos entregam de forma exemplar. Tirando muitos pontos em que não se pode escalar e dos muros invisíveis que seguram esse sentimento de explorar o que não pode, todo o resto o jogo executa com maestria.
Para os momentos finais de toda análise muitas vezes me pego pensando em pontos de crítica, coisas que jogos poderiam melhorar, refinar, que valem uma cutucada, mas sendo bem sincero, olhando para toda a minha experiência com Clair Obscur: Expedition 33, e ainda mais num Xbox Series S, o console de menor potência da geração atual, não consigo, nesse momento, encontrar nada em que preciso reclamar ou pontuar.
O jogo entrega visuais soberbos, uma narrativa cativante, original e criativa, que te compele a continuar jogando, querendo saber mais sobre o destino desse mundo e de seus personagens. O gameplay é outro ponto que segue uma execução primorosa. Todo o sistema de combate é intuitivo, é divertido, é desafiador. Os comandos respondem bem, as lutas dão liberdade para diferentes estratégias, os menus para equipar armas, pictos é muito fácil de manejar, não tem realmente nada que tenha me incomodado.
Em termos de RPG, Clair Obscur: Expedition 33 é de longe um dos jogos mais legais que joguei em 2025 até o momento. Tudo nele funciona, tudo nele é divertido, tudo nele é instigante e magnífico. É um obra única, não resta dúvida.
Galeria
Dando nota
Apresentação impecável, todo o mundo do jogo é muito bem construído e interessante - 10
Narrativa envolvente, com ótimo mistério, personagens cativantes e desenvolvimento narrativo que compele a continuar - 10
Sistema de combate por turnos é velha guarda, mas está muito bem modernizado aqui - 10
Toda a estrutura das batalhas é bem idealizado, com mecânicas interligadas entre si - 10
Personagens com sistemas de combate únicos, que criam jeitos diferentes de lidar com o conceito dos turnos - 10
Exploração bem estruturada, caminhos não lineares e itens para serem recolhidos, dá o senso de recompensa - 10
Direção de arte primorosa, tudo no jogo é magnífico em proporções visuais - 10
10
Fantátisco
Clair Obscur: Expedition 33 é fantástico em tudo que se propõe a ser, não se prende na velha fórmula do combate por turno e traz o conceito a era moderna. O jogo tem mecânicas ótimas, batalhas intensas, tem ritmo, tem velocidade, tem estratégia e cada personagem tem seu próprio estilo de combate. O mundo é fantástico, construído pesadamente em uma fantasia sombria, o jogador teme pelos personagens, imerge na trama proposta e fica abismado com o incrível mundo criada para esta aventura. Um RPG como há tempos não se via ser lançado.