Análise | Valkyrie Elysium

Disponível para PlayStation 4, PlayStation 5 e (em breve) PC

Valkyrie Elysium resgata a ideia de uma icônica franquia, datada lá dos tempos do primeiro PlayStation (PSOne), agora com suas mecânicas reinventadas, mesclando ação hack & slash com elementos de Action RPG. E já adianto: o conceito e proposta funciona, mas toma algumas distâncias significativas em relação ao universo da obra original. Não é pra menos que o jogo deixa de lado o título “Profile” que caracteriza os jogos anteriores da série, e se utiliza da denominação “Elysium”, deixando claro de que se trata de um derivado (spin-off).

Seu lançamento ocorreu no último dia 23 de setembro, exclusivamente para o PlayStation 4 e PlayStation 5. E uma versão de PC está agendada para ser lançada no próximo dia 11 de novembro. Distribuído globalmente pela Square Enix, o jogo foi desenvolvido pelo estúdio japonês Soleil, conhecido por ter trabalhado em games como Ninjala, Samurai Jack: Battle Through Time, Naruto to Boruto: Shinobi Striker e também em Travis Strikes Again: No More Heroes.

Vale apontar que originalmente a série Valkyrie Profile teve seus jogos desenvolvidos pelo estúdio japonês Tri-Ace, também responsável por outros clássicos do gênero JRPG, como Resonance of Fate e a série Star Ocean, que por sinal, terá uma nova investida neste universo, em Star Ocean: The Divine Force, que está para ser lançado já na próxima semana.

Portanto, com um estúdio diferente assumindo uma série de outro estúdio, de uma IP (propriedade intelectual) pertencente a Square Enix, acaba sendo natural certas liberdades para mexer na fórmula e formato. Assume-se como um spin-off, e se dá liberdade para que os desenvolvedores possam reimaginar uma obra há muito tempo parada. Afinal, o último título saiu em 2009, lá no Nintendo DS (Valkyrie Profile: Covenant of the Plume). E até mesmo na fase da Tri-Ace, a franquia passou por mudanças significativas em suas mecânicas e até mesmo gráficos. Ou seja, não é nada anormal que isso tenha acontecido mais uma vez, só que desta vez na mão de um outro estúdio contratado para fazer tal resgate da IP.

O fim do mundo está novamente à caminho

Tema recorrente nos jogos da franquia, estamos novamente as voltas do Ragnarok, o fim do mundo apontado pela mitologia nórdica. Odin convoca Nora, uma nova valquíria, para que ela reúna forças e tente impedir o mesmo. Nora não tem memória de seu passado, mas isso é colocado em pauta quando uma valquíria rival surge e a confronta. Talvez as coisas não sejam como Nora pense que são.

Outro elemento comum dos jogos da série, e que estão de volta aqui, são os Einherjar, espíritos perdidos no mundo, com assuntos pendentes, mas que possuem grande força e podem se aliar a Valquíria que o convocar como aliado. Em Valkyrie Elysium é possível recrutar quatro Einherjar ao longo da campanha principal.

O jornada de Nora ocorre em Midgard, o mundo dos humanos na mitologia nórdica, enquanto Ragnarok parece devastar o mundo como o conhecemos. Isso é justificado pela quase nula quantidade de pessoas vivendo nos ambientes a qual Nora acaba visitando, agora repleta de serem das trevas e criaturas devastadoras. O que Nora irá encontrar em alguns ambientes são almas perdidas, com assuntos pendentes, que irão se transformar em objetivos secundários dentro da progressão linear do jogo.

Isso dá uma sensação de solidão em Valkyrie Elysium. O jogador irá visitar planícies, castelos e imensas vilas, contudo todas estas locações estarão vazias, sem NPCs para interagir, apenas inimigos para serem derrotados. Apesar de contextualizado pela trama, essa ausência de personagens dá uma sensação estranha para um jogo que tem certa base no gênero RPG. Há poucas interações, o que atrapalha até que o jogador se simpatize com o mundo ou se importa em que o Ragnarok seja impedido. Afinal, já não há mais vida em Midgard.

Talvez seja por causa desse aspecto que há uma enorme quantidade de um certo colecionável que é representado por um ramo de flores azuis. Sempre que essas flores são coletadas, o jogador irá ouvir algumas das vozes desse mundo em decadência. E cada missão tem uma quantidade considerável desse item escondido entre o cenário. Contudo, apesar de tentar dar alguma emoção, ao fim esse item apenas se traduz como uma tela estática, com uma caixa de texto. Não há rostos, gestos, não é algo realmente humanizado.

Isso também ocorre com algumas das almas que habilitam as missões secundárias do jogo. A primeira missão extra, por exemplo, é de uma alma de uma jovem garota que pede que Nora resgate o anel de sua mãe, perdido perto da localidade em que se está explorando. Em nenhum momento o jogo mostra a cara desta alma, representada apenas por uma labareda azul, e quando você chega ao local em que precisa recuperar o anal, é preciso derrotar uns inimigos e pronto. Anel recuperado, missão cumprida. Não há uma cutscene, nem mesmo uma representação humanizada destes personagens. É uma decisão muito estranha em termos de desenvolvimento narrativo.

Esse parâmetro só muda quando Nora encontra os personagens que se tornam seus companheiros, os tais Einherjar. Nesse caso há muito diálogo e história, dos motivos para estarem perdidos no mundo, para quererem ou não se aliarem a Nora e até mesmo mais a frente, na história principal com Odin e a valquíria rival, deles assumirem papéis importantes na condução da linha narrativa.

Exploração linear e a curva de combate

A campanha de Valkyrie Elysium se desdobra em 9 missões principais, além de 8 secundárias. Esse número pode soar baixo, mas as missões principais são realmente longas, segmentadas em diversos momentos únicos, contra diferentes situações, como mini chefes ou hordas de inimigos. Um missão do jogo em na média cerca de uma hora de duração, e não se preocupe com ter que interromper no meio caso necessário, pois há diversos save points ao longo de sua progressão.

As missões secundários são um pouco menores, podem durar na média 30 minutos, e normalmente revisitam os mesmos estágios das missões principais, porém por outros caminhos ou trajetos reversos. Não chega a ser muito impressionante, contudo algumas destas missões tem recompensas importantes, como novas armas para serem utilizadas em sua jornada.

Alias, até mesmo as missões principais reciclam um pouco suas áreas, normalmente duas missões principais na mesma localidade, para que depois Odin possa enviar Nora para outra região do mundo. Mesmo reciclando os cenários, os trajetos normalmente são diferentes, ainda que em termos de design de fase, Valkyrie Elysium não seja muito inspirador. Como se trata de um mundo em decadência, espere encontrar muitas ruínas e locais devastados, com uma paleta de cor mais sombria, apática. Não é uma aventura realmente bonita, por assim dizer.

A progressão pelos estágios é quase sempre muito linear, dando apenas liberdade ao jogador para explorar esquinas e vielas laterais, que podem levar a um ou outro colecionável, além de baús escondidos. Explorar não é tão recompensador, ainda que seja essencial encontrar uma flor verde escondida em cada um das missões principais do jogo para, só então, desbloquear o final verdadeiro do jogo. Ao todo, há quatro finais possíveis.

No contexto geral a progressão se utiliza muito pouco da verticalidade que o jogo poderia ter. Boa parte da ação ocorre no chão mesmo, e não há muito pelo que escalar ou subir. Isso torna os estágios um pouco mais óbvios e menos inspirados do que se poderia imaginar. Contudo, existem segmentos escondidos a qual o jogador deve utilizar seu Einherjar para abrir caminho para áreas escondidas, como congelar uma plataforma ou destruir um obstáculo que esteja bloqueando o caminho.

Já na parte do combate, aqui há algumas considerações a se considerar. Primeiro que o combate focado em ação hack & slash é interessante e divertido, porém tem uma curva inicial que demora a emplacar e pode deixar o jogador entediado nas horas iniciais da aventura. O problema é que o combate não tem muito peso inicialmente, com armas que parecem leves demais ou inimigos que não são afetados pelos golpes a proporção a qual são compelidos. Isso melhor a partir do momento em que se ganha itens para aprimorar estas armas e assim desbloquear combos e golpes mais poderosos, que aí sim causam a sensação de impacto nos inimigos.

No geral há dois botões de ataques, leve e pesado, a qual o jogador pode alternar em diferentes combos, quando tiver desbloqueados os mesmos. O mais legal mesmo são as diferentes armas que também vão sendo desbloqueadas conforme a aventura avança. Você começa com uma espada básica, mas logo descobrirá espadas mais ágeis e até mesmo lanças, que ampliarão o leque de estratégias de ataques para múltiplos adversários, já que os inimigos presentes aqui lutam em uma esquema de arena, lhe cercando e te atacando em conjunto.

Contudo, Valkyrie Elysium não se comporta tão somente como um hack & slash simplório, a qual basta ficar esmagando botões que dará tudo certo. Pelo contrário, fazer isso irá resultar em diversas derrotas. Enquanto desfere seus ataques o jogador deve estar atendo as fraquezas de magia elementais dos inimigos, podendo imbuir suas arcas com tais magias e assim quebrando a barra de defesa dos inimigos, podendo deixá-los atordoados por preciosos segundos.

O mais interessante é o sistema de invocação, que pode ser tanto de magia, quanto de seus Einherjars, que serão sumonados para lhe auxiliar no combate. Os Einherjar não podem ser controlados pelo jogador, e nem a obedecer comandos muito específicos. Contudo são personagens que sabem se virar muito bem, e realmente auxiliam no combate, ocupando a atenção de inimigos para que estes não venham a lhe atacar pelas costas. Estes companheiros também possuem danos elementais e são essenciais para se lidar com grupos de inimigos que sejam fracos contra seus elementos.

Enquanto o jogador pode invocar Einherjar, também há um menu radial que lhe permite soltar algumas magias. Ao longo da aventura é possível encontrar diversas magias e até mesmo variações mais fortes destas, e quatro delas podem ser equipadas nesse menu de combate. Assim da mesma forma que Nora pode atacar com suas armas, alternando rapidamente entre duas facilmente customizadas em um menu no D-Pad, ela também pode recuar para soltar magias de ataque ou até mesmo de cura. Magias e Einherjar possuem são próprias barras de mana, então usar magia não compromete a invocação do Einherjar e vice versa.

Em um contexto geral, o combate de Valkyrie Elysium pode ser considerado como um bom sistema, dando algumas escolhas interessantes ao jogador, que podem abordar diferentes combates com diferentes opções de investida. Só não é melhor porque o jogo segura propositalmente a evolução de suas armas até certo ponto da trama, com itens que não estão disponíveis inicialmente, e inimigos que não são lá muito inteligentes ou desafiadores. A quantidade de inimigos é um problema maior do que o tipo em si.

O combate ainda permite algumas peripécias, como lançar o inimigo para cima, bloquear e realizar uma investida lateral para escapar de um ataque. O mais interessante, contudo, é um gancho espiritual, a qual Nora pode lançar em um inimigo e assim voar velozmente até o mesmo. Conforme sua arma evolui, um ataque de investida com o gancho também passa a ser possível.

Toda a progressão de personagens, armas e Einherjar se dá por um sistema tanto de experiência quando de itens coletados. Existe até mesmo uma árvore de habilidades. Porém o jogo parece sempre dar a impressão de saber quando esse aumento deve e vai acontecer, tirando assim do jogador aquela liberdade para griding (ficar lutando para ficar mais forte do que a progressão normal determina).

Considerações finais

Valkyrie Elysium certamente tem bons méritos como uma franquia que estava há certo tempo esquecido e que precisava retornar as atividades. Sem dúvida há um pouco do DNA a qual tornam os títulos da Square-Enix tão atraentes, ainda que não tenha como foco explorar com fidelidade a fórmula clássica que deu origem a tudo.

A bem verdade é que o novo escopo, mais Action RPG, com combate em tempo real similar a um hack & slash, não é de todo mal ruim, mas fica claro que a obra não consegue explorar a totalidade do subgênero, especialmente quando se coloca lado a lado com certos concorrentes como Devil May Cry 5, Bayonetta 2 ou até mesmo Nier Automata. Falta aqui um pouco mais de ação visceral, câmera mais ousada, e combates mais frenéticos. Não basta apenas o feijão com arroz da categoria.

Visualmente o título também causa acertos e derrapadas. O visual que mistura gráficos reais com um toque visual sutil em cel-shade no contorno parece funcionar para os personagens e as cutscenes com os mesmos, mas a direção de cenários não acerta quando escolhe cenários sóbrios, sem vida, ainda que sob a justificativa narrativa proposta. A beleza cenográfica é muito pontual, e na maioria das vezes esquecível. Além disso um mundo vazio é um pouco deprimente para um RPG, a qual o jogador deseja se apaixonar pelo universo proposto, suas pequenas histórias, para que passe a se importar com seu objetivo principal.

Na parte da progressão, Valkyrie Elysium também não vai de todo mal, porém não consegue ir tão bem quanto se poderia desejar. Parte disso vem do que expôs do parágrafo acima, um mundo a qual você não se importa muito. O formato de longas missões também entrega uma experiência muito linear, inclusive sem espaço para experiências mais paralelas, tento em vista que são poucas missões secundárias e o mundo nunca pode ser explorado de maneira mais livre. Trata-se de um jogo de 20/30 horas que quando acaba, realmente acaba.

Entretanto parte dessa experiência limitada tende a se expandir no próximo dia 11 de novembro, quando a versão de PC será lançada e um DLC Gratuito será lançado junto. Neste conteúdo os jogadores irão encontrar uma grande masmorra para ser explorada, que mudará a cada nova partida, além de dois novos níveis de dificuldade e também poderão jogar com a valquíria antagonista da campanha principal, Hilde. Sim, são conteúdos que você pode imaginar que já deveriam estar no jogo, mas que não estão. Ao menos virá muito em breve.

Ao fim, acho que Valkyrie Elysium é um revival interessante de uma franquia há muito deixada de lado. Acerta em algumas coisas, erra em outras. Gosto do fato do título chegar ao mercado brasileiro totalmente localizado, com legendas em português em tudo, tanto diálogos como menus, o que o torna muito mais acessível ao público atual. Para uma geração carente de jogos com grande impacto, dada uma pandemia que prejudicou em muito o desenvolvimento de diversas obras, Valkyrie Elysium não deve causar tal comoção, mas entrega algo modesto e honesto, em uma IP que necessitava de tal atenção. Nada que uma sequência não pudesse refinar os pontos fracos, ainda que para esta investida, vale a pena dar uma chance.

Galeria

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Dando nota

Resgata uma franquia perdida no tempo e muito querida por fãs - 8
Sua narrativa não apresenta nada exatamente novo, mas ainda assim cumpre seu papel - 7.5
Mudança para o gênero hack & slash com elementos de Action RPG funciona, contudo demora a emplacar - 7.5
Graficamente é bonito, mas um mundo esvaziado torna difícil dar certa empatia - 7.8
Localização em português nos diálogos e menus torna acessível ao nosso mercado - 8.5
Missões lineares, ainda que longas, deixam a execução do gameplay meio ríspido - 7.8
Combate é interessante, armas diferentes, boas magias e sistema de invocações, mas tende a ser repetitivo - 7.8

7.8

Bacana

Valkyrie Elysium resgata uma série consagrada no passado dos consoles PlayStation, reiniciando a fórmula, mantendo certos parâmetros enquanto reinventa seu gameplay, que funciona em momentos muito pontuais. Ambientes vazios deixam sua narrativa um tanto carente, enquanto o combate diverte, mas demora a emplacar. Vale a experiência, mas certamente uma sequência poderia aprimorar seus pontos fracos. Conteúdo gratuito que será lançado em novembro tende a alongar a cauda de replay do jogo, enquanto uma campanha linear não dá muita margem para longevidade.

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